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Estudo realizado em São Carlos aponta para novo tratamento de doenças cardiovasculares

Descontentamento de pesquisadora se dá em um momento no qual cientistas brasileiros se veem diante de uma contenção de recursos financeiros

12 Dez 2017 - 10h26Por Redação
Foto: Divulgação - Foto: Divulgação -

O polipeptídio BPP-BrachyNH2, uma das composições que podem ser extraídas da secreção da pele do sapo Brachycephalus ephippium, eventualmente poderá auxiliar o desenvolvimento de um eventual tratamento inédito para doenças cardiovasculares, patologias que atingem o coração e os vasos sanguíneos, liderando a lista das complicações de saúde que mais causam mortes no mundo (estima-se que, em 2012, esse tipo de doença ocasionou cerca de 17,5 milhões de falecimentos).

A pesquisa, que visou à análise da interação entre o polipeptídio e uma enzima denominada ACE (angiotensin-I converting enzyme), compreendeu testes in silico (cálculos teóricos computacionais), in vitro e in vivo (neste último caso, com ratos), tendo permitido observar que a interação entre o polipeptídeo e a enzima resultou em uma ação semelhante a do Captopril, medicamento indicado atualmente para o tratamento de doenças cardiovasculares.

O trabalho foi desenvolvido pela Profa. Dra. Yvonne Primerano Mascarenhas e a Dra. Ana Carolina Mafud, do Grupo de Cristalografia do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), em parceria com colegas do Brasil e de Portugal. Os resultados foram divulgados recentemente no International Journal of Peptide Research and Therapeutics. De acordo com Yvonne, o objetivo do trabalho é desenvolver um fármaco que seja tanto ou mais eficaz e barato do que o Captopril.

A publicação do artigo ocorreu a partir de uma colaboração que se consolidou através da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Em maio de 2009, a Coordenação anunciou os 38 projetos científicos que havia selecionado, para auxiliá-los com aporte financeiro durante quatro anos, por meio da REDE NANOBIOTEC - BRASIL (Edital 04/CII-2008), tendo como propósito o apoio a pesquisas e à formação de recursos humanos na área de nanobiotecnologia. Dentre as propostas selecionadas, havia o projeto Avanços, Benefícios e Riscos da Nanobiotecnologia Aplicada à Saúde, coordenado por Yvonne Mascarenhas e Valtencir Zucolotto, ambos docentes e pesquisadores do IFSC/USP, para o qual a Rede concedeu R$ 2.400.000,00 dos R$ 70.324.097,51 investidos em todas as 38 iniciativas científicas.

Foto: DivulgaçãoO valor que havia sido destinado ao projeto de Yvonne foi dividido entre 13 grupos de pesquisadores da USP e de outras universidades que, com o apoio financeiro da Rede em questão, publicaram mais de 130 artigos científicos e depositaram 14 patentes relacionadas à aplicação de nanomateriais em terapia e diagnóstico. Mas, oito anos depois, Yvonne relembra que ela e seus colegas elaboraram um relatório e o submeteram à Capes. De acordo com a docente, o documento descrevia os resultados promissores e a colaboração alcançados graças às inúmeras atividades de colaboração entre os grupos associados à Rede, e a Capes, prometeu o lançamento de um segundo edital até o final de 2014, o que não ocorreu até este ano.

O descontentamento de Yvonne se dá em um momento no qual cientistas brasileiros se veem diante de uma contenção de recursos financeiros que reflete negativamente no desenvolvimento científico brasileiro. Com poucos recursos, mas com esperanças de melhores condições de trabalho, os pesquisadores tentam não perder o entusiasmo - quando perdem, podem desistir da carreira ou ir para o exterior em busca de melhores oportunidades profissionais, como já vem acontecendo em muitos casos, conforme explica a docente do Instituto de Física de São Carlos. "Lamentamos profundamente o fato de que estamos passando por esse período em que a ciência parece que não tem importância, pois sofre os maiores cortes", comenta Yvonne, relatando também que há grupos de pesquisa "praticamente à míngua".

Mas, à medida que lamenta, também reconhece o esforço e a vitória que estão na perseverança de muitos pesquisadores brasileiros: "Ainda existe um esforço heroico de não parar as pesquisas. Mas elas certamente pararão dentro de muito pouco tempo, porque nós não teremos recursos para manter as mínimas condições para manutenção dos laboratórios e demais serviços essenciais".

Para ela, os poucos recursos financeiros destinados à ciência brasileira e a redução na oferta de bolsas científicas poderão esmorecer os projetos científicos e o futuro da ciência nacional: quando a situação melhorar (se melhorar), aonde estará a mão de obra qualificada que dará continuidade ao avanço científico nacional, se as circunstâncias atuais causam desânimo naqueles que querem produzir pesquisa? A previsão para os próximos anos da ciência é "péssima", diz Yvonne: "O Governo [Federal] não está tendo visão de (pelo menos) manter os recursos, que já não eram 'grande coisa'".

Para Yvonne Mascarenhas, só haverá mudança quando se aceitar que fornecer aporte financeiro à ciência e tecnologia é investimento, e não desperdício. (Rui Sintra e Thierry Santos - Assessoria de Comunicação - IFSC/USP)

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