quinta, 25 de abril de 2024
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A Psicologia e a Amplitude para Novas Formas de Existir

28 Ago 2020 - 15h39Por Anaísa Mazari
A Psicologia e a Amplitude para Novas Formas de Existir -

Na data de ontem, 27 de agosto, foi comemorado o Dia Do Psicólogo. Psicólogos costumam ser “pensados” ou procurados quando as próprias pessoas identificam que existe essa necessidade a partir de desconfortos emocionais. Para muitos que ainda não tiveram a experiência de um processo terapêutico, as imagens da profissão costumam estar associadas a um simples momento de desabafo, à obtenção de conselhos prontos e a uma identidade predominantemente clínica que já se expandiu para os mais diferentes contextos desde sua regulamentação profissional. Hoje em dia, em seus 58 anos de regulamentação no Brasil, a psicologia integra diferentes atuações tais como psicologia social, psicologia organizacional e do trabalho, psicologia esportiva, psicologia hospitalar, psicologia jurídica, psicologia do trânsito etc.

Para muito além da escuta e de orientações prescritivas, que são muitas vezes demandadas pelos clientes, quando o processo é justamente fazer pensar e sentir em novas perspectivas, a prática do profissional psicólogo consiste em uma condução e facilitação para revisitar a história e o mundo interno a partir dos acontecimentos que moldaram e moldam o indivíduo para a atualidade. Geralmente o que move as pessoas para a procura de um profissional da área são desconfortos, conflitos, ciclos que se repetem, disfunções, tristezas e ansiedades que são comunicações relevantes acerca de que algumas vivências podem sinalizar a necessidade de elaboração. Os aspectos emocionais fazem parte da saúde geral e da qualidade de vida de formas muito mais impactantes do que se possa imaginar, embora na compreensão de muitos a saúde mental seja ainda acessória ou coadjuvante em processos em que as raízes psicogênicas costumam ser secundarizadas. Por mais que se “continue” a existência, muitos sofrimentos acarretam prejuízos que podem demandar tratamento com benefícios indiscutíveis ao bem-estar de quem se habilita a uma real transformação de vida e novas posturas frente à caminhada.

O tratamento em psicologia compreende a totalidade relevante de uma interação positiva entre aquele que busca a ajuda e o profissional. Desconstruídas as percepções de cura prescritiva ou de um simples momento de desabafo, o cliente deve fazer um compromisso consigo mesmo, ativando o próprio processo de mudança. Abertura (real) para a mudança é uma condição essencial para um processo terapêutico bem sucedido, pois nenhum profissional, por mais gabaritado que seja, será capaz de “invadir” o mundo interno de um cliente e mesmo que fosse possível, o processo dessa forma certamente não apresentaria bons resultados; só vamos até onde o cliente permite e até onde ele se deixa trabalhar em sua própria construção de sentidos. Por sua vez, alguns níveis de resistências são inerentes ao processo. A caminhada terapêutica, contudo, necessitará de persistência que se renova a cada etapa, pois em momentos de descobertas internas específicas, o cansaço, a fuga, as “ausências” temporárias ou duradouras, os “atrasos” podem aparecer e evidenciar desejos de se distanciar daquilo que parece ameaçador, mas que quando enfrentado, será justamente o portal para novas vivências muito mais promissoras de um novo tempo de desenvolvimento e evolução.Para a mudança, é necessária a flexibilização, a entrega à relação terapêutica, a mudança na expressão dos problemas, o desprendimento de lugares existenciais como os papéis de “vítima”, “salvador” e “acusador”, inconscientemente adotados por pessoas que se recusam a serem protagonistas e autoras do próprio existir. Frente a muitas realidades, podemos não ter poder de ação, mas discriminar quem somos dentro dos contextos, quem somos a partir da nossa história de vida e elementos felizes e dolorosos, de que forma podemos nos posicionar, como desejamos continuar... Compete inteiramente a cada um de nós, algo que só poderemos exercer com consciência e autodescobertas, resultados da real disponibilidade interna para o processo.

Da mesma forma, considerando que a interação é construída de forma compartilhada entre o profissional e o cliente, quando se busca um atendimento psicológico, é importante também que algumas características inerentes à profissão sejam observadas. O atendimento em psicologia segue diversos aspectos que têm propósitos bem delineados. O acolhimento, por exemplo, vai desde o cuidado com o ambiente onde o cliente é recebido até a postura empática que se estabelece desde o primeiro contato que poderá contribuir sensivelmente para uma maior abertura desde os primeiros momentos. Uma escuta qualificada de um profissional de psicologia, garantido o sigilo, será muito abrangente, abarcando, além do que é expressado verbalmente, o que também não é dito mas se expressa pela linguagem corporal, expressões faciais, reações a perguntas e estímulos, comportamentos. A fala é como uma música com letra e melodia, não apenas palavras... Durante a relação terapêutica, haverá momentos de maior escuta e acolhimento, outros em que haverá intervenções do profissional no sentido de nomear sentimentos, construir novas interpretações, esclarecer contradições, fazer perguntas estratégicas para reflexões relevantes, pontuar resistências e abrir o caminho para novas possibilidades. A aceitação incondicional é um dos pressupostos primordiais para a construção de uma boa relação terapêutica, sendo recomendado que o atendimento jamais seja atravessado por convicções pessoais do profissional. Daí a recomendação de que os profissionais também façam psicoterapia, para terem a clareza de seus próprios conteúdos emocionais, sendo também dever do psicólogo que encaminhe demandas para as quais não se sinta emocionalmente ou profissionalmente apto a atender. Outro cuidado importante é discriminar práticas “místicas” que costumam ser ofertadas em sessões de atendimento como se fosse algo inerente à profissão da psicologia, tais como uso de passes, terapia de vidas passadas que parte do pressuposto da crença em reencarnação, psicologia cristã, associando dogmas religiosos para condução de processos terapêuticos etc. Crenças e espiritualidade merecem respeito e devem ter seus locais específicos para acontecerem. A psicologia tem seu papel diferenciado de contribuir para o desenvolvimento da amplitude de potencialidades sempre trazendo o protagonismo do sujeito em seu próprio processo de transformação– o que deve estar esclarecido até mesmo para que represente uma porta aberta para a diversidade de pessoas que podem – incondicionalmente - se beneficiar da ciência para alcance de melhor qualidade de vida e bem-estar emocional.

Nenhum processo de mudança é rápido e linear. Mas a psicologia pode ser um maravilhoso convite para despertamentos necessários, transformando ciclos e reorientando o caminho existencial.

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