Elis Hernandes Ervolino, atual CIO da Marlabs Brasil, no interior da empresa em São Carlos. - Crédito: Foto Abner AmielNo Dia Internacional da Mulher é celebrado as conquistas e os avanços das mulheres em diversas áreas da sociedade, mas é na tecnologia que elas têm mostrado sua força de forma inovadora e transformadora. Em um setor onde ainda predominam os homens, mulheres estão quebrando barreiras, desafiando estereótipos e ocupando espaços de liderança, inovação e criação.
O SCA entrevistou Elis Hernandes Ervolino, atual CIO da Marlabs Brasil, empresa americana que comprou a brasileira Monitora Soluções Tecnológicas, em maio de 2023, instalada no Passeio São Carlos. CIO é a sigla para Chief Information Officer, que significa Diretor de Tecnologia da Informação (TI) de uma empresa. Elis, que está na empresa desde 2014, é PhD em Engenharia de Software pela UFSCar e tem MBA em Administração e Negócios pela FGV. Durante o doutorado, a CIO participou de um programa de estudos na Universidade do Alabama (EUA). Ela também é professora convidada para o curso de pós-graduação em Computação pela UFSCar. Além disso, na Marlabs, que possui no Brasil 200 funcionários (37 mulheres) ligados à planta de São Carlos, Elis lidera um time de especialistas que usam a engenharia de software para criar soluções e evoluir digitalmente empresas e pessoas ao redor do mundo.
Também, Elis desempenha um papel fundamental incentivando e impulsionado mulheres na área da tecnologia. Durante a entrevista, a CIO da Marlabs explica que, apesar dos avanços, as mulheres ainda enfrentam desafios na indústria da tecnologia, como preconceito de gênero e desconfiança. Mas é um mercado em evolução com o surgimento de empresas que valorizam a liderança feminina. Veja a entrevista completa abaixo.
1.Quais foram os maiores desafios que você enfrentou como mulher na área de tecnologia?
Eu acredito que todo mundo enfrenta desafios na carreira que deseja seguir. Eu comecei a minha carreira bem jovem na área de tecnologia e, desde o começo, enfrentei o preconceito de ser uma mulher jovem. No começo da minha carreira, eu fui impedida de entrar numa sala para realizar o trabalho que eu precisava executar porque a pessoa era mais velha. Era um senhor, ele viu que eu era uma mulher. Ele tinha aquele pré-conceito de que uma mulher jovem não iria ensinar ele ou não iria instalar o software que ele precisava usar para o trabalho dele. Isso aconteceu numa empresa, no meu primeiro emprego. Então, eu já enfrentei esse tipo de desafio no dia a dia com clientes ou com colegas e vi outras colegas de profissão também terem o mesmo problema. A gente percebe que tem pessoas machistas, que não aceitam que uma mulher tenha mais conhecimento e não aceitam que uma mulher tenha mais poder que elas numa empresa.
Às vezes, se comportam com mais respeito com um homem que está numa posição inferior a uma mulher. Também já me deparei com clientes que não querem falar comigo, querem falar com algum homem da empresa. Então, tudo isso acontece e são desafios que enfrentamos com frequência na carreira.
2.Você percebe mudanças no ambiente de trabalho em relação à inclusão de mulheres na tecnologia? O que ainda precisa melhorar?
Percebo que muitas empresas estão atentas à diversidade no ambiente de trabalho, incluindo mulheres. No mercado de tecnologia, já podemos ver mulheres líderes competentes e extraordinárias. Muitas empresas já reconhecem o potencial das mulheres. É comum hoje ver empresas com ações e vagas direcionadas para mulheres, tentando incentivar e dar oportunidade para mulheres assumirem seu papel na área de tecnologia. Vejo que há uma mudança no mercado, visto que grandes empresas questionam sobre o percentual de mulheres no quadro de funcionários e quantas dessas mulheres estão em papéis de lideranças. Então, é importante frisar que existe um movimento no mercado de valorizar empresas que valorizam as mulheres e a diversidade no geral. Também acredito que empresas com ações voltadas para diversidade para incluir mulheres na área de tecnologia têm uma vantagem competitiva também na hora de prestar serviço para outras grandes empresas.
3.Quais iniciativas ou programas você acredita que poderiam ser eficazes para incentivar mais mulheres a ingressar na área de tecnologia?
Conheço alguns programas que são muito interessantes. Aqui em São Carlos mesmo na USP tem programas organizados pelas professoras que incentivam meninas do ensino fundamental e do ensino médio a conhecerem a tecnologia. Na internet tem programas como Meninas Programadoras, Maria Programa. Acredito que o desafio é fazer com que esses programas atinjam mais mulheres, especificamente nas escolas.
Ressalto que o grande desafio, quando a gente fala de mulheres em áreas exatas, é que as mulheres, desde muito novas, não são incentivadas a conhecer a área de TI. A sociedade acaba levando-as para outras profissões relacionadas à beleza, moda. Já os meninos têm contato com a tecnologia muito cedo, com acesso ao videogame, à eletrônica, e desenvolvem habilidades desde pequenos.
4.Na sua experiência, qual é a maior barreira para as mulheres em tecnologia em termos de oportunidades e reconhecimento profissional?
Acredito que o primeiro desafio já começa na graduação. Entrar numa universidade e se manter é complicado. Vejo que estagiárias ou pessoas mais jovens que conheço nem sempre encontram um ambiente propício para se desenvolver e eliminar alguns gaps que têm por não conhecerem a eletrônica desde cedo, por não terem um conhecimento sólido em matemática, lógica. Têm muitos meninos que já entram na universidade já programando porque tiveram essa oportunidade. O outro desafio é crescer na carreira. Vejo que para as mulheres serem reconhecidas é mais difícil, porque passa pela questão de meninos às vezes não aceitarem que a menina sabe mais ou não aceitarem a capacidade de liderança de uma mulher. Essas coisas criam empecilho.
Percebo que as mulheres têm que correr um pouco mais para conquistar seu espaço. É importante lembrar também que, no decorrer da carreira, a maternidade ainda é vista como empecilho. Então, quando uma mulher decide ser mãe, ela tem aquela pausa na carreira que o homem não tem. Mas essa pausa não gera impacto na carreira. As mulheres precisam que a empresa e os colegas de trabalho entendam este momento de gestação e ofereçam apoio.
É importante ressaltar ainda que o mercado já está percebendo que mulheres têm senso crítico, conseguem resolver conflitos, têm habilidades diferentes de homens, que ter homens e mulheres trabalhando em conjunto só gera benefício para a empresa. Por isso já é possível ver mulheres brilhantes que atuam nas áreas de tecnologia e fazem total diferença no serviço que é prestado e no produto que é desenvolvido.
5.O que o Dia Internacional da Mulher significa para você e para as mulheres que atuam em áreas predominantemente masculinas, como a tecnologia?
A gente brinca que o dia das mulheres é todo dia, mas acho que datas como essa, assim como tantas outras que celebramos ao longo do ano, são importantes para levantarmos algumas questões, como a do papel das mulheres na tecnologia ou em outros setores da sociedade. Então, acredito que é uma data importante para ter essa discussão em pauta para as pessoas lerem e discutirem sobre o assunto.
6.Quais conselhos você daria para jovens mulheres que têm interesse em seguir carreira na área de tecnologia?
Meu principal conselho é para as mulheres serem incansáveis. Se uma jovem deseja trabalhar na área de tecnologia tem que tentar. Não pode parar diante de um não, diante de uma ironia de colega de trabalho, diante de pessoas que tentam te diminuir. Usa essas situações para se fortalecer.
No tocante ao mercado de trabalho, não vejo barreiras para uma mulher conseguir trabalhar na área de TI. Hoje o mercado de trabalho em tecnologia da informação tem muitas oportunidades. Então, naturalmente, uma mulher possuindo uma formação adequada, estando disposta a entrar no mercado de trabalho e fazer o que precisa ser feito, consegue um trabalho.





