ALESP - Crédito: agência brasilTer uma votação maciça em São Carlos é importante, mas não é o fator determinante para que um candidato a deputado estadual ou federal se eleja em 2026. Muito mais fundamental que isso é o candidato ser colocado como “prime”, ou seja, como prioridade do partido, o que leva a agremiação a organizar recursos, cabos eleitorais relevantes e situações que destaquem esse concorrente. A reflexão é do jornalista João Marcos Gomide, que atuou no Grupo Globo por mais de 30 anos e é estudioso do tema. Ele cita o caso da deputada estadual Thainará Faria, de Araraquara. Ela recebeu 91.381 votos no Estado de São Paulo, sendo apenas 17.871 — ou 21% do total — em Araraquara. Thainará conquistou, só na capital paulista, 27.086 votos, expressivos 30% de sua votação total e quase 10 mil a mais do que em sua cidade.
O jornalista João Marcos Gomide: “Vimos na eleição de 2022 que os candidatos a deputado estadual em São Carlos tiveram poucos votos em outras cidades”SÃO CARLOS AGORA – Uma das grandes chances de São Carlos eleger um deputado é que os são-carlenses que estiverem na disputa se credenciem como "candidatos primes" ou "prioritários" dos partidos, aqueles que têm cabos eleitorais e votos em todo o Estado. Você acha que algum dos pré-candidatos de São Carlos pode obter esse status?
JOÃO MARCOS GOMIDE – Em tese, sim. A direção estadual do partido pode pedir votos para quem tem maior potencial no Estado. Vimos na eleição de 2022 que os candidatos a deputado estadual em São Carlos tiveram poucos votos em outras cidades.
Por exemplo, o candidato Júlio César, do PL, foi o 181º mais votado, com 29.209 votos. Em São Carlos, foi o mais votado, com 21.128 votos — 72% do total.
O candidato Djalma Nery, do PSOL, foi o 215º mais votado, com 21.380 votos. Em São Carlos, recebeu 12.100 — 56% do total.
Os dois ficaram muito distantes dos deputados estaduais eleitos. O 70º candidato que entrou recebeu 45.094 votos.
Veja os 6 candidatos a deputado estadual mais votados em São Carlos:
1º Júlio César (PL): 21.128
2º Djalma Nery (PSOL): 12.100
3º Roselei Françoso (MDB): 9.469
4º Élton Carvalho (Republicanos): 6.994
5º Eduardo Suplicy (PT): 4.140
6º Dé Alvim (Solidariedade): 2.796
SCA – Thainará Faria teve uma votação até pífia em Araraquara, sua base, mas foi votada em centenas de cidades. Ser votado em várias regiões do Estado é mais importante do que uma votação maciça na própria cidade de domicílio eleitoral?
GOMIDE – O deputado estadual eleito precisa muito de votos de outras cidades. Só depender da base eleitoral é insuficiente na maioria dos casos.
Por exemplo, Araraquara teve duas deputadas estaduais eleitas pelo PT em 2022. A deputada Márcia Lia (39ª mais votada) recebeu 108.587 votos no Estado de São Paulo. Em Araraquara, obteve 11.139 votos — apenas 10% do total.
Já a deputada Thainará Faria (51ª mais votada) recebeu 91.381 votos no Estado. Em Araraquara, obteve 17.871 votos — apenas 21% do total. Só na cidade de São Paulo, recebeu 27.086 votos, expressivos 30% do total. Muitos desses votos resultam do trabalho do partido.
SCA – Dorival Braga, em 1994 e 1998, se elegeu deputado estadual concentrando seus votos em sua cidade, Porto Ferreira (75% dos votos), Descalvado (50%), Santa Rita do Passa Quatro, Pirassununga e Santa Cruz das Palmeiras, praticamente cinco municípios. O senhor acha que essa estratégia já não serve mais?
GOMIDE – Para cidades menores, dificilmente dará a eleição. Veja o exemplo do ex-prefeito de Votuporanga, Carlão Pignatari, do PSDB. Ele recebeu 105.245 votos. De sua cidade [96 mil habitantes], muito menor do que São Carlos, obteve 18.646 votos — 17% do total. Foi eleito com votos de outras cidades de São Paulo.
SCA – As igrejas, principalmente as evangélicas, elegem muitos deputados. Por que nenhuma delas consegue eleger um candidato da cidade, com votação forte em São Carlos e em todo o Estado, já que estão presentes em praticamente todos os 645 municípios paulistas?
GOMIDE – Para isso dar certo, todas as igrejas teriam que concentrar votos em um determinado número de candidatos. Não é o que acontece. Cada cidade escolhe o seu candidato, e a votação local se enfraquece.
SCA – A política de São Carlos tem uma dinâmica que chega a ser curiosa. Estou cansado de ver políticos que dão entrevistas falando que a cidade deve ter menos candidatos para conseguir finalmente eleger deputados. Porém, esses mesmos políticos, que defendem a redução, já concedem a entrevista se colocando como pré-candidatos, contradizendo o que acabaram de pregar. Como o senhor vê essa hipocrisia política?
GOMIDE – É direito de cada partido e de cada candidato da cidade disputar a eleição. Não vai funcionar essa tese de que São Carlos deve lançar só um ou dois candidatos para sair daqui com milhares de votos. Só vai funcionar se o candidato e, principalmente, o partido, trabalharem sua candidatura no Estado de São Paulo. Cerca de 25 candidatos em 2022 receberam entre 50 mil e 66 mil votos e não foram eleitos, acabando como suplentes.





