Equipe responsável pelo desenvolvimento do projeto - Crédito: divulgaçãoUma nova tecnologia desenvolvida em São Carlos promete diagnosticar precocemente a presença de parasitas que prejudicam as plantações de algodão e soja e evitar até 60% de queda na produtividade em áreas infestadas pelas doenças.
Na pesquisa realizada, um robô atua na escuridão, guiado por luz e inteligência artificial, abrindo novas possibilidades para o monitoramento de lavouras brasileiras. Desenvolvido pela Embrapa Instrumentação, em São Carlos (SP), em parceria com a Cooperativa Mista de Desenvolvimento do Agronegócio (Comdeagro), de Mato Grosso, o LumiBot combina robótica, fotônica e aprendizado de máquina para identificar precocemente a presença de nematoides parasitas que causam prejuízos bilionários nas culturas de algodão e soja.
A novidade, assim como o robô, foi apresentada oficialmente durante o Simpósio Nacional de Instrumentação Agropecuária (Siagro), no dia 14 de outubro, no Campo Experimental de Automação Agropecuária da Embrapa Instrumentação.
O sistema opera de forma autônoma e, em apenas sete segundos, consegue iluminar e fotografar as folhas das plantas com uma câmera científica RGB, capaz de registrar cores com alta precisão. Na sequência, um software processa as imagens e detecta alterações sutis de cor e luminosidade associadas ao metabolismo vegetal. Essas variações indicam a ocorrência de estresses bióticos, como ataque de fungos, bactérias ou nematoides, e abióticos, como deficiência nutricional e falta de água.
O trabalho é comandado pela pesquisadora Débora Milori, chefe do Laboratório Nacional de Agrofotônica (Lanaf). Segundo ela, o robô foi projetado para oferecer diagnóstico precoce antes mesmo que os sintomas sejam visíveis a olho nu. O LumiBot coleta dados e constrói modelos capazes de identificar padrões de fluorescência das folhas com taxas de acerto superiores a 80%, o que possibilita prever a presença do parasita ainda nas primeiras fases de infestação, quando o controle é mais eficaz.
"Quando conseguimos fazer um mapeamento preciso de uma infestação dentro de uma área cultivada, conseguimos identificar as doenças de forma antecipada e também damos ao produtor ferramentas para que ele tome a melhor decisão quanto à sua lavoura. Se for o caso de uma erradicação, ela pode ser feita; se for o caso de aplicação de um agroquímico, ele terá as informações para tomar a melhor decisão sobre o problema", explica Débora.
O QUE SÃO NEMATOIDES Os nematoides são vermes microscópicos, de 0,3 a 3 milímetros, que vivem no solo e atacam as raízes das plantas, prejudicando a absorção de água e nutrientes. No algodão, as perdas anuais ultrapassam R$ 4 bilhões e, na soja, R$ 27 bilhões, segundo estimativas da Sociedade Brasileira de Nematologia (SBN).
"Geralmente, as perdas mais expressivas associadas aos nematoides são observadas na soja e no algodão. No entanto, atualmente já é possível constatar que esses patógenos afetam negativamente a produtividade de praticamente todas as culturas agrícolas do País", afirma a presidente da SBN, Andressa Cristina Zamboni Machado.
O pesquisador Rafael Galbieri, do Instituto Mato-grossense do Algodão (IMAmt), alerta que algumas propriedades registram até 60% de queda na produtividade em áreas altamente infestadas, o que torna as lavouras inviáveis. O monitoramento tradicional depende de análises de solo e da observação de sintomas nas folhas e raízes processos lentos, caros e que exigem coleta manual. Por isso, o diagnóstico rápido e automatizado é considerado um passo importante para a agricultura de precisão.
O LumiBot utiliza a técnica de Imagem de Fluorescência Induzida por LED (LIFI), um método não destrutivo que analisa a luz emitida por compostos moleculares das folhas quando estimulados por luz ultravioleta. Essa "assinatura óptica" varia conforme o estado fisiológico da planta, permitindo diferenciar uma infecção de um simples estresse hídrico.
Débora Milori detalha que o robô emite um feixe de luz ultravioleta-visível e captura a resposta luminosa das folhas em um ambiente totalmente escuro. Com isso, é capaz de eliminar interferências externas e viabilizar a obtenção de imagens limpas, que revelam alterações metabólicas provocadas pelos nematoides.
O equipamento se movimenta por trilhos instalados entre as fileiras das plantas em casas de vegetação, avaliando uma a uma. Cada imagem registrada é armazenada em um dispositivo externo e identificada com código único para posterior análise. Os dados alimentam modelos de aprendizado de máquina, treinados para reconhecer padrões de fluorescência associados a doenças específicas.
Em três anos de experimentos, foram coletadas cerca de sete mil imagens de plantas de algodão e soja. O sistema foi capaz de distinguir infecções causadas por duas espécies de nematoides Aphelenchoides besseyi e Rotylenchulus reniformis e de separar esses casos de outras situações de estresse, como falta de água.
A equipe responsável pelo projeto reúne estudantes e pesquisadores de diferentes áreas: engenheiros, físicos, biólogos e biotecnólogos. Entre eles estão Tiago Santiago, que analisa os dados e treina os modelos de IA; Vinícius Rufino, responsável pela instrumentação; Julieth Onofre, doutora em física e especialista em óptica; e Kaique Pereira, biólogo que conduz os experimentos e o controle dos parasitas.
A próxima fase do projeto prevê o desenvolvimento de uma versão adaptada para uso em campo, acoplada a veículos agrícolas, como pulverizadores do tipo gafanhoto ou rovers autônomos.
SUSTENTABILIDADE Além de antecipar o diagnóstico, o LumiBot pode ajudar a reduzir o uso de defensivos químicos. O controle tradicional de nematoides se baseia em produtos aplicados no solo ou nas sementes, que têm custo elevado e eficácia variável. A pesquisadora explica que, com o mapeamento preciso das áreas afetadas, é possível aplicar defensivos apenas onde realmente há infestação, o que representa economia, eficiência e menor impacto ambiental.
O consultor da Comdeagro, Sérgio Dutra, reforça a importância da tecnologia para a agricultura de precisão. Segundo ele, detectar o problema cedo permite uma ação localizada, evitando desperdício e garantindo maior qualidade da produção. Por isso, o LumiBot é uma ferramenta estratégica para tornar o agronegócio brasileiro mais competitivo e sustentável.
INTEGRAÇÃO A tecnologia faz parte de um projeto apoiado pela Embrapii Itech-Agro (Integração de Tecnologias Habilitadoras no Agronegócio), unidade da Embrapa Instrumentação que promove parcerias entre empresas e instituições de pesquisa. O protótipo físico foi desenvolvido em conjunto com a empresa Equitron Automação, de São Carlos (SP), especializada em robótica e sistemas embarcados.
Débora explica que a pesquisa está na metade do caminho e o próximo desafio será desenvolver um sistema mais portátil para uso em campo. "Já fizemos vários testes em laboratório. No Siagro, demonstramos um robô que está atuando dentro de uma casa de vegetação, que é uma condição mais próxima do campo. Pretendemos desenvolver um sistema mais portátil para ir a campo. Então, a pesquisa está no meio, digamos assim. Nós temos bons resultados validados em laboratório e em um ambiente mais relevante, que é uma casa de vegetação, e agora pretendemos buscar parcerias com empresas que tenham interesse nesta tecnologia para que possamos transferir para o setor produtivo e acelerar o desenvolvimento de um equipamento portátil para ir a campo", destaca.
A fotônica, área da física que estuda a geração e aplicação da luz, cada vez mais usada na medicina, nas comunicações e na agricultura, está no centro da inovação. Isso porque, de acordo com Débora, a luz tem como vantagens ser rápida, sensível a variações biológicas e não gerar impacto ambiental.
"Uma alternativa mais eficiente e econômica seria o monitoramento da área plantada, com a aplicação de estratégias de controle apenas nas regiões efetivamente infestadas. No entanto, ainda não existem equipamentos comerciais capazes de detectar precocemente a presença da doença nas plantas. Nesse contexto, o uso de técnicas fotônicas surge como uma solução promissora", conclui Débora.








