Crédito: DivulgaçãoEm 15 de outubro de 1884, acompanhado pelo presidente da Câmara Municipal e pelo juiz da Comarca, Dr. Joaquim Inácio de Moraes, o fazendeiro e político Antônio Carlos de Arruda Botelho, então Visconde do Pinhal, inaugurou a ferrovia são-carlense — marco que, para o saudoso historiador Ary Pinto das Neves, selou o destino progressista do local, evitando que se tornasse mais um “burgo pobre”.
O fato é que a ferrovia impulsionou ainda mais o progresso local, ligando o município ao restante do mundo, numa espécie de globalização do século XIX.
A origem da prosperidade paulista está diretamente ligada à expansão do transporte ferroviário — inovação tecnológica recente na segunda metade do século XIX e importada da Inglaterra — para viabilizar o escoamento do café até o Porto de Santos e, de lá, para o mundo.
A inovação irrompeu fragorosa no sossegado universo caipira e trouxe, além da modernidade, levas de imigrantes vindos dos recantos mais afastados do planeta para os sertões do interior paulista. O impacto cultural resultou no definitivo desbravamento e na completa povoação do Estado.
O apito inconfundível das velhas marias-fumaças era o moderno canto da sereia que, de forma incontestável, encantou aquele novo caldo cultural que se formava. Ao mesmo tempo, as choupanas de pau-a-pique eram derrubadas para dar lugar a novas cidades, fábricas e oficinas, marcando o início de um ciclo econômico e cultural de grande pujança. Os ventos sopravam a favor, já que o café alcançava excelentes preços no mercado internacional.
São Carlos do Pinhal, fundada em 1857 e abrigo de vários fazendeiros produtores de café, decidiu não perder a oportunidade de progresso que surgia. Em 4 de outubro de 1880, o Governo Imperial autorizou a constituição da companhia de estradas de ferro. Sendo assim, em 1882, por iniciativa do fazendeiro e deputado provincial Antônio Carlos de Arruda Botelho — que encontrou eco entre os demais cafeicultores da região —, foi criada a Companhia Rio Claro de Estradas de Ferro, com a proposta de ligar São Carlos do Pinhal a Rio Claro e, mais tarde, a Araraquara. O empreendimento, que custou a exorbitante quantia de três mil contos de réis, foi o primeiro do gênero a não contar com recursos públicos.
Superar a topografia entre Rio Claro e São Carlos do Pinhal, porém, não era tarefa fácil. Era um obstáculo do qual se esquivaram as grandes companhias ferroviárias e que ameaçava condenar São Carlos ao passado. Para vencê-lo, o futuro Conde do Pinhal contou com a ajuda de um jovem engenheiro que havia estudado na Europa: Antônio Francisco de Paula Souza.
O velho fazendeiro definiu o traçado devido à sua experiência de mateiro, acostumado a vencer aquela área a cavalo. Para superar a aspereza da encosta do planalto, decidiram pelo contorno do vale do Corumbataí, passando por Anápolis, e galgando a serra entre os morros do Cuscuzeiro e da Boa Vista — onde hoje está o município de Analândia.
“A imaginação dos são-carlenses se deliciava em esperanças de que, pouco mais tarde, o estridente sibilar da locomotiva impeliria a carreiras vertiginosas os veados e as emas dos campos do Feijão.”
(Cincinato Braga, historiador)
A INVENÇÃO DA FERROVIA
No início do século XIX, o inventor inglês Richard Trevithick construiu a primeira máquina capaz de aproveitar altas pressões de vapor para girar um eixo trator. Montou-a sobre um chassi de quatro rodas, projetado para deslocar-se sobre trilhos.
Em 1804, Trevithick realizou uma experiência com esse veículo, puxando um vagão carregado com nove toneladas de carvão por uma via férrea com 15 km de extensão. Essa foi a primeira locomotiva bem-sucedida do mundo. Outros inventores logo seguiram seu exemplo, buscando desenvolver e aperfeiçoar aquela ideia.
George Stephenson, construtor inglês de locomotivas a vapor, edificou a primeira ferrovia pública do mundo, ligando Stockton a Darlington, inaugurada em 1825. Cobria uma distância de 32 km e tornou-se a primeira ferrovia do mundo a conduzir trens de carga em horários regulares. Um ano antes, em 1824, Stephenson já havia vencido um concurso de velocidade para locomotivas, patrocinado pela companhia ferroviária Liverpool and Manchester Railway, com uma locomotiva chamada The Rocket.
A construção de ferrovias difundiu-se rapidamente da Inglaterra para todo o continente europeu. Por volta de 1870, a espinha dorsal da atual rede ferroviária da Europa já havia sido construída. Linhas principais e auxiliares adicionais foram erguidas no final do século XIX e início do século XX.
Algumas dessas linhas exigiram a construção de túneis através dos Alpes, ligando a França à Itália. O Túnel Simplon, que une a Itália à Suíça, foi concluído em 1906 e, com 20 km de extensão, continua sendo um dos maiores túneis ferroviários do mundo.









