sábado, 27 de abril de 2024
Artigo Rui Sintra

Se alguém me disser que sou “Português de mer...”

22 Mar 2024 - 06h00Por (*) Rui Sintra
Se alguém me disser que sou “Português de mer...” -

Ainda estou verdadeiramente perplexo com o lamentável episódio envolvendo as declarações chulas do diretor de futebol do São Paulo Futebol Clube, Carlos Belmonte, dirigidas ao técnico português Abel Ferreira, do Palmeiras, no início deste mês. E o que vou escrever abaixo não se trata de futebol. Quando atingi a plena adolescência (17/18 anos), entre outros conselhos e/ou ensinamentos que recebi de meu pai, um deles foi que se alguma vez eu tivesse a desfaçatez de insultar ou ofender alguém, e que se esse fato chegasse ao conhecimento dele, “as contas serão feitas em casa entre eu e você”. De igual forma e em sentido inverso, o conselho de meu pai foi no sentido de que, caso alguma vez eu fosse insultado ou ofendido, a melhor resposta seria “responde com o silêncio, olha nos olhos de quem te ofendeu e procura a forma correta e legal para punir o responsável por isso”. Enquanto na escola os professores tinham a missão de ensinar, de instruir os alunos, em casa cabia aos pais a missão de lhes dar educação, daí que ter um diploma certamente valia muito, mas ter educação valia o dobro e isso ficava muito evidente na avaliação que era feita nas entrevistas para obter emprego. E nós, portugueses, que viemos para o Brasil para viver na nossa segunda Pátria, trouxemos na bagagem todos esses e outros ensinamentos e experiências, motivos pelos quais a comunidade portuguesa, principalmente a que se estabeleceu na cidade e no Estado de São Paulo, é considerada, em termos gerais, um exemplo de cidadania. E esse exemplo de cidadania, de entrega aos deveres, de humildade, de respeito pela história de nosso país, dos modos de estar e ser, da cultura e costumes, do respeito que nutrimos pelos outros (tão diferentes de nós) e pelo País que nos acolheu, por vezes gera “ruídos”, gera insatisfações - algumas delas disfarçadas - e até, como neste caso, insultos e ofensas de cunho xenófobo pelo simples motivo  de as pessoas (ou a pessoa em causa) estarem a realizar seu trabalho de forma correta e honesta. Nos tempos que correm, a xenofobia se instalou em todos os continentes e países e Portugal não fugiu a essa nova realidade, muito embora a esmagadora maioria de sua população, que mantém sua educação de raiz, repudie frontal e energicamente esse e outros tipos de discriminação, até porque está no seu sangue milenar a convivência com outros povos. Voltando ao caso protagonizado por Carlos Belmonte, que recentemente (vários dias após o incidente) publicou um vídeo nas redes sociais pedindo desculpas a Abel Ferreira, ao Palmeiras e à Comunidade Portuguesa pelas ofensas proferidas, tenho a firme convicção de que ele foi pressionado a fazer isso, ou seja, essa retratação não surgiu do seu âmago, porque, se saísse, ela não precisaria ser publicada nas redes sociais “para brasileiro e português verem”: seria quase que imediata, por telefone ou pessoalmente frente ao ofendido. O verdadeiro arrependido faz exatamente isso. Sobre este episódio, o silêncio das várias representações portuguesas sediadas no Estado de São Paulo reflete exatamente aquilo que sublinhei acima “responda com o silêncio, olhos nos olhos”. Contudo, se me for permitido um desabafo...“Quem não se sente, não é filho de boa gente!”.

O autor é jornalista profissional/correspondente para a Europa pela GNS Press Association / EUCJ - European Chamber of Journalists/European News Agency) - MTB 66181/SP.

Esta coluna é uma peça de opinião e não necessariamente reflete a opinião do São Carlos Agora sobre o assunto.

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