sexta, 26 de abril de 2024
Artigo Rui Sintra

Fazenda Santa Maria do Monjolinho e o legado do Prof. Ernesto de Souza Campos

29 Abr 2022 - 07h55Por (*) Rui Sintra
Fazenda Santa Maria do Monjolinho e o legado do Prof. Ernesto de Souza Campos -

Quem não ouviu falar, ou ainda não conhece a Fazenda Santa Maria do Monjolinho, localizada em São Carlos?

Formada por Theodoro Leite de Almeida Penteado (1847-1925), a propriedade tem sua origem na Sesmaria do Monjolinho, possuindo (para deleite de quem a visita) várias construções que remontam ao período cafeeiro, bem como diversas particularidades históricas, como, terreiro, tulha, maquinário destinado ao beneficiamento do café, além de uma capela e senzala que foram devidamente adaptadas para receber os imigrantes após a abolição da escravatura (1888).

O casarão senhorial, construído em 1889 e projetado pelo arquiteto italiano Pietro Cassinelli, é o símbolo edificado da riqueza que o café gerou em toda esta região, principalmente a partir de 1850. Em 1904, após a grave crise financeira que assolou o país, este magnífico patrimônio foi adquirido por Cândido Souza Campos, irmão daquele que viria a ser um dos maiores vultos da cultura e educação do Brasil e do Estado de São Paulo – o Prof. Ernesto de Souza Campos (1882-1970), também ele talvez desconhecido de muito boa gente.

Nascido em Campinas e filho do então Senador da República, Antonio de Souza Campos, Ernesto de Souza Campos foi professor emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e personalidade dotada de uma visão de futuro verdadeiramente notável, que deixou um legado enorme, principalmente na área da educação superior do país. No governo de Armando Salles de Oliveira, Ernesto de Souza Campos foi um dos principais idealizadores e planejadores do campo universitário do Butantã, local onde viria a ser construída a Universidade de São Paulo, algo que contribuiu, certamente, para que fosse chamado para planejar outros centros acadêmicos e hospitalares em diversos estados brasileiros, como, por exemplo, Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, Paraná e Rio Grande do Sul.

Ministro de Estado da Educação no governo do General Eurico Gaspar Dutra, e em virtude de suas excepcionais contribuições para o desenvolvimento do sistema universitário brasileiro, o Prof. Ernesto de Souza Campos foi agraciado com o título de Diretor e de Professor Honorário nas universidades de São Paulo, Bahia, Pernambuco, Paraná e da Pontifica Universidade Católica de São Paulo, bem como Grande Oficial da Ordem de Mérito Nacional, da Legião de Honra da França e de outras diferentes ordens nacionais e estrangeiras. Foi, ainda, presidente do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, do Pen Club de São Paulo e membro da Academia Paulista de Letras, estando sua obra científica reunida em cerca de 20 volumes e de uma centena de monografias publicadas no país e no exterior.

Na Fazenda Santa Maria do Monjolinho, cabe agora ao Dr. Décio Luiz Malta Campos, de quem o Prof. Ernesto de Souza Campos é seu tio-avô, capitanear, com sua esposa, Senhora D. Carmem Rocha Ribeiro Campos, e nora, Vera Regina Zavaglia Malta Campos, junto com os restantes membros da família, a catalogação e preservação de todo o riquíssimo espólio documental, bem como o lote de objetos da época e o conjunto arquitetônico que complementam e enriquecem o conhecimento.

Independente das dificuldades e ainda produzindo café, milho, mandioca, cana-de-açúcar, gado leiteiro, gado de corte, granja, cavalos e carneiros, a missão da família de Ernesto de Souza Campos tem, assim, outra grande missão – talvez a maior - que é garantir o conhecimento através do conjunto arquitetônico e de seu espetacular acervo, abrindo a porta da história a todos quantos desejem e fazendo-os mergulhar na vida e obra do Prof. Ernesto de Souza Campos, eternizadas em solo são-carlense e umbilicalmente ligadas à história da Universidade de São Paulo.

O texto acima foi escrito em 2016, mas seu conteúdo continua atual. O tempo passou, inexoravelmente, e o acervo - majoritariamente documental - continua lá, mas sofrendo as consequências inevitáveis da ação do clima sobre a sua antiguidade. Na passada quarta-feira estive na Fazenda Santa Maria do Monjolinho com dirigentes da USP que ali fizeram uma visita e se inteiraram das principais prioridades para preservar o riquíssimo acervo, já que, como dissemos acima, ele preenche uma lacuna importante não só na história da fundação da USP, na cidade de São Paulo, bem como na criação do Campus da USP, em São Carlos, algo que está indelevelmente ligado à história de nossa cidade.

Unido ao grupo de grandes entusiastas pela preservação deste acervo - Família Malta Campos e os professores da USP, Carlos Goldenberg, José Marcos Alves e Tito José Bonagamba -, aguardo com ansiedade a ação que a Universidade de São Paulo tomará em relação a este assunto, que, do meu ponto de vista, também deverá ser equacionado pelo poder local de nossa cidade. É que, como escreveu a historiadora Emília Viotti da Costa “Um povo sem memória é um povo sem história”.

O autor é jornalista profissional / correspondente para a Europa pela GNS Press Association  / EUCJ - European Chamber of Journalists / European News Agency) - MTB 66181/SP.

Esta coluna é uma peça de opinião e não necessariamente reflete a opinião do São Carlos Agora sobre o assunto.

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