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sábado, 13 de dezembro de 2025
Bonde dos Covidlovers

Funk com letra ‘pesada’ é lançado para conscientizar aqueles que não acreditam na Covid-19

Idealizado pelo O Grupo da Complexidade na Pandemia, canção com 55 segundos mostra a letalidade do SARS-CoV-2

01 Mar 2021 - 07h40Por Marcos Escrivani
Oishi: “Precisamos ser mais inteligentes e criativos nas ações para combater esse vírus” - Crédito: DivulgaçãoOishi: “Precisamos ser mais inteligentes e criativos nas ações para combater esse vírus” - Crédito: Divulgação

Uma letra pesada, mas que reflete bem o momento atual da pandemia da Covid-19 que afeta populações de todos os países do planeta e que está em uma letal segunda onda no Brasil.

O jingle, de 55 segundos, cujo teor é conscientizar as pessoas que ainda não acreditam na infecção que hoje tem colapsado várias cidades brasileiras, com UTI’s lotadas, foi idealizado pelo Grupo da Complexidade na Pandemia e hoje circula nas redes sociais.

O São Carlos Agora entrevistou na tarde deste domingo, 28, Jorge Oishi, 72 anos, Matemático, Estatístico e doutor em Saúde Pública pela USP, professor aposentado do Departamento de Estatística da UFSCar, atualmente sócio da Statsol, Soluções Estatísticas e Pesquisa de Mercado de São Carlos. Ele foi um dos idealizadores do “Bonde dos Covidlovers”, a cança em ritmo de funk. "As estratégias tradicionais de conscientização já não funcionam mais há algum tempo, por isso resolvemos apelar para a criatividade", disse. Ideia original do jungle é de Oishi. A letra e música eo Berimbau Estúdio e produção do clipe pela Oz Produtora. "

“O Grupo da Complexidade na Pandemia existe desde março de 2020. Em 2021, passei a servir de porta voz do grupo na apresentação de propostas para os gestores públicos não só de São Carlos como também para os municípios da DRS 3 – Diretoria Regional de Saúde cuja sede fica em Araraquara, mas que atende a 24 municípios da região.  Esse grupo é formado por pesquisadores de várias instituições como a UFSCar, USP, UNICAMP, UNESP de Araraquara, Embrapa e Instituto Pólis, que se reuniram para ajudar no combate à pandemia. Tendo como cenário de fundo, a Teoria da Complexidade, buscamos discutir a pandemia sob essa ótica para descobrir soluções que levem em conta o conjunto de agentes ou fatores que atuam no processo de disseminação da covid-19”, explicou Oishi.

Em uma entrevista exclusiva ao portal, o Matemático e Pesquisador detalhou os motivos de idealizar o funk, o motivo da escolha do ritmo e qual público que busca atingir. Paralelamente pontuou a motivação de frases tão pesadas que compõem a canção.

Ponderado, Oishi emitiu opiniões bem pessoais sobre o momento em que São Carlos, o Estado e o Brasil atravessa quanto a pandemia da Covid-19, afirmando ainda que cientistas e pesquisadores buscam conhecer o SARS-CoV-2 e desaprovou o jogo de empurra-empurra, ao se referir ao fato de uns jogarem “nas costas” dos outros os problemas econômicos porque passam o país e ver que o novo coronavírus sai ileso deste embate.

A ENTREVISTA

São Carlos Agora - Após um ano, como o senhor vê os trabalhos realizados pelo grupo em São Carlos?

Jorge Oishi - Desde o início a gente vem trabalhando para entender como a pandemia se comporta, acompanhando os estudos científicos feitos no mundo todo. Como somos pesquisadores, temos facilidade para ler e entender os estudos realizados, e de selecionar os que tem alta credibilidade daqueles que são feitos às pressas e tem baixa credibilidade. Assim, com a nossa bagagem foi possível juntar um bom conhecimento sobre como esse vírus age e também sobre as metodologias usadas no planeta para combater a pandemia. Já realizamos inúmeras reuniões com os gestores da saúde, tanto de São Carlos como de Araraquara, bem como dos prefeitos da região da Diretoria Regional de Saúde do Estado – DRS 3, composta de 24 municípios, no sentido de auxiliar a criação de ações de políticas públicas para controlar a disseminação da covid-19.

SCA - Ao completar justamente um ano de pandemia, foi criado um jingle de 55 segundos. Qual a finalidade desta canção?

Oishi - O nosso grupo atua junto dos gestores públicos, mas também de forma desvinculada dos gestores públicos, na comunicação para conscientizar a população do perigo que esse vírus representa para toda a sociedade. Partimos do pressuposto que um cidadão devidamente conscientizado desse perigo certamente se protegerá mais, tomando mais cuidados para não se contaminar e também para não contaminar os outros que estão em sua companhia. Essa parte todos nós podemos fazer sem precisar da anuência do poder público. Desde o começo da pandemia já elaboramos uma série de produtos de comunicação que vem fazendo esse trabalho, e apenas para citar um exemplo, criamos um jingle no ano passado, em parceria com outros grupos como o Move Sanca, e Berimbau, que foi o “Tira a mão daí”, que foi divulgado inclusive pelo Jornal Nacional.

Com o avanço da pandemia em São Carlos, achamos que o atual momento precisa de um recado um pouco diferente, tendo em vista que a grande maioria da população já está devidamente informada a respeito da pandemia, mas que grupos de pessoas ainda são “resistentes” aos apelos das autoridades, e continuam disseminando o coronavírus por aí. Dentre esses estão alguns que frequentam as baladas, que se juntam em festinhas particulares sem a devida proteção, principalmente em reuniões familiares, fazendo com que o número de pessoas da mesma família que vão parar nos hospitais esteja chamando muito a atenção dos médicos e enfermeiros que atuam nas UTI’s. Por isso é que criamos esse funk para alcançar esse segmento, na tentativa de chamar a atenção deles, porque se mantido esse comportamento, quaisquer outras tentativas de conter a pandemia corre o risco de não dar certo.

SCA - Percebe-se que há frases “pesadas”, que mostram a letalidade do SARS-CoV-2. Qual a finalidade? Apenas a conscientização ou mostrar que esta infecção pode deixar marcas profundas em famílias. Foi escolhido o ritmo funk. Tem um público alvo específico?

Oishi - O público específico são as pessoas que costumam se aglomerar em festinhas, baladas, pancadões e que precisam ouvir uma mensagem diferente das que estão sendo divulgadas pela mídia oficial. A letra e o ritmo foram pensados para atingir esse público acostumado a usar palavras pesadas, pois mensagens mais leves certamente não vão produzir efeito desejado para esse segmento. Para a grande maioria da população já são veiculadas normalmente mensagens mais brandas, chamando a atenção de forma mais educada. O funk tem a característica de ser um tipo de mensagem que pode ser facilmente ser entendida e reproduzida de forma instintiva, basta ver e ouvir que já começamos a querer canta-la. Vimos isso com crianças.

SCA - Na frase “adoro seu egoísmo, deixar o mundo morrer...” deixa caracterizado que parte da população é apenas negacionista, tem tendências políticas ou as vezes é por pura ignorância que não acredita nas consequências do novo coronavírus?

Oishi - A intenção é de alcançar todos os que parecem gostar da covid demonstrado pelo seu comportamento. Por isso o nome Covidlover. Quem não se protege e acha que os outros são trouxas em se proteger, no mínimo não está dando a menor bola para o vírus. Ou então não tem a mínima ideia do que acontece se ele ficar contaminado e ter de ir para uma UTI. Por isso, quem sabe se ouvindo e prestando atenção na letra do funk, ele começa a refletir e mudar de opinião.

SCA - Uma opinião bem pessoal do senhor: acredita que, de uma forma geral, a pandemia está sendo bem combatida em São Carlos? Por que?

Oishi - Tenho de deixar bem clara a minha opinião a esse respeito, que inclusive já me manifestei em outras ocasiões. Qualquer avaliação que eu possa fazer nesse sentido vai certamente ser muito falha, por não estar atuando junto dos gestores e sem conhecer a real situação em que o município se encontra. Do ponto de vista do conhecimento científico sobre a pandemia, podemos dizer que ela não está controlada, segundo os indicadores da OMS e da Fiocruz, e os dados que temos demonstra isso. Mas não quero aqui emitir um juízo de valor culpando os gestores de São Carlos porque sei que eles estão empregando todos os esforços e com muita garra na tentativa de interromper o fluxo da doença e que se não fazem mais é por falta tanto de pessoal, que não se trata apenas do setor saúde, mas também de outros setores como a segurança pública, bem como de recursos financeiros. E posso falar disso com um bom conhecimento de causa pois já ajudamos o munícipio com o projeto “Testar Para Cuidar” na qual fui o idealizador e um dos coordenadores, e que visitamos e testamos mais de 5 mil famílias de São Carlos. Trabalhamos juntos dos gestores públicos naquela ocasião, vivenciamos a grande vontade e disposição de fazer um bom trabalho por parte deles. Por isso, como grupo, estamos agora nos colocando à disposição dos municípios para ajudar, talvez em algum refinamento das ações já realizadas, mas que por problemas que fogem ao nosso conhecimento, não estão dando conta de conter a disseminação da pandemia. Pode ser devido à nova variante que é muito mais contagiosa e produz efeito mais duradouro do que a versão inicial do coronavírus. De qualquer modo, seria importante unir os nossos conhecimentos para produzir ações que sejam mais eficazes no momento atual.

SCA - Hoje, a pandemia da Covid-19 mostra que está aumentando em todo o Estado. As medidas restritivas atuais são adequadas. Ou é necessário um endurecimento maior.

Oishi - Como não estamos conseguindo conter esse avanço, sabemos que as medidas adotadas até agora não foram suficientes. Por isso é preciso, não digo aumentar o endurecimento delas, mas talvez analisar os porquês de não estarem dando certo localmente, ou seja, em cada município, e a partir daí é que podemos criar novas medidas ou endurecer as que estão sendo praticadas. Sem uma análise mais profunda dos motivos da falta de controle, fica difícil responder de forma afirmativa a qualquer solução dessas.

SCA - Tem fé que possa ocorrer em breve o “novo normal”? Em sua opinião, quando isso deverá ocorrer?

Oishi - Na minha humilde opinião, somente vamos conseguir sair dessa situação quando a maioria da população estiver vacinada e a imunização ocorrer de fato. O prazo ainda é uma grande dúvida pois vai depender de muitas coisas, como do Ministério da Saúde na política de vacinação, da presidência da República nos relacionamentos com os fabricantes das vacinas, da política internacional de protecionismo para atender prioritariamente os países mais ricos, da existência de insumos para a fabricação das vacinas, até termos vacina para todos. Se continuar confuso do jeito que está dificilmente sairemos dessa situação até o final do ano.

SCA - Acredita na vacina contra a Covid-19? Irá se imunizar ou já se imunizou?

Oishi - Existe uma porção de fake news em relação à vacina que precisam ser desmitificadas. Ninguém questiona a eficácia das vacinas que tomamos todos os anos, seja da gripe, seja do sarampo, seja da pólio, mas estão colocando um monte de dúvidas sobre as novas vacinas. O que todos precisam saber é que a eficácia dessas vacinas velhas conhecidas não é maior do que essas da covid-19, algumas sendo até bem menor. A ciência aplicada no desenvolvimento dessas vacinas já é muito avançada e possui todos os requisitos de uma medicação qualquer que ingerimos para as doenças que já possuímos. Portanto, nada de ter medo de tomar quaisquer uma das vacinas, pois ela são menos perigosas do que, por exemplo, comer carne embutida que adoramos, como salsicha e salame. Ainda não me vacinei, pois tenho só 72 anos e não chegou a minha vez.

SCA - Como um cidadão que acredita na letalidade do novo coronavírus, qual a mensagem que deixa para aqueles que ainda não acreditam da infecção?

Oishi - Eu diria para ele fazer uma visitinha aos hospitais e conversar com os intensivistas que são os médicos e enfermeiros que trabalham nas UTI’s. Aqui na Santa Casa de São Carlos, mais da metade dos pacientes com a covid-19 que vão para a UTI com covid, morrem! Quando um sujeito entra na UTI ele fica em média 18 dias internado, enquanto alguém que é internado por um infarto, por exemplo, fica apenas 3 dias em média. Além disso o cidadão precisa ver o estado como ele fica durante esse tempo na UTI, não é deitado certinho na cama, mas às vezes tem de ficar numa posição nada agradável, ou seja, de bruços e com uma cânula enfiada na garganta que é o tubo do respirador que leva o ar para ele poder respirar. Esse cano na garganta incomoda muito e também pode machucar a boca das pessoas. Enfim, se alguém ainda duvida da seriedade, faça essa visita e converse com algum desses profissionais para ter uma boa ideia das consequências dessa doença.

SCA - Considerações finais:

Oishi - Gostaria de acrescentar três coisas que acho muito importantes e que talvez não tenham ainda sido refletidas com profundidade pela população e para alguns que lidam diariamente com a pandemia.

1. Temos de dar a devida atenção a esse coronavírus porque ele tem dado um baile nos cientistas e gestores do mundo todo! Não podemos considera-lo como um vírus igual aos que já estamos acostumados. O SARS Cov-2, o nosso coronavírus, depois de um ano, ainda não conseguimos domina-lo, apesar dos esforços de todos os pesquisadores e especialistas da área de todos os países do mundo. O fato da letalidade dele não ser alta produz uma diminuição na atenção a ele, por achar que ele não é tão perigoso assim. Mas não se enganem, precisamos respeita-lo, dar a ele a devida atenção, pois só assim é que vamos reunir condições efetivas de controla-lo.

2. Uma das coisas que me chamam a atenção é a forma com que os gestores e a sociedade vêm se comportando, como se o inimigo não fosse a doença, mas os outros seres humanos. Como não conseguimos controlar a doença, estamos jogando a culpa nos outros. A população joga a culpa no governo, nos gestores públicos; o setor econômico joga a culpa na saúde que não respeita os empregos, os salários, os pobres etc.; os gestores públicos jogam a culpa na população que não colabora e assim forma-se um círculo vicioso e o coronavírus vai passando liso no meio desse pessoal batendo as cabeças, e eu diria com um sorriso de galhofa como quem diz: “e eles se dizem os seres mais inteligentes do planeta!”

Portanto, se não nos unirmos, todos com um único objetivo que é combater essa pandemia de forma irmanada e coletiva, vamos continuar como o Brasil frente à Alemanha na Copa do Mundo: tomando de goleada!

3. Precisamos ser mais inteligentes e criativos nas ações para combater esse vírus. Como já temos muita informação acumulada sobre ele, precisamos usar todo esse conhecimento, com inteligência e criatividade para melhorar ou criar outras ações para esse combate. Não se continua uma batalha usando as mesmas armas que já conhecemos como ineficazes. Precisamos ser mais inteligentes do que este minúsculo ser, que nem vivo é. Será pedir muito para a sociedade?

“Bonde dos Covidlovers

Sou o bonde da Covid pronto pra infectar

Aqui só entra sem noção, vem galera aglomerar

Quero ver você com febre,

Quero ver você tossindo,

Sem máscara álcool gel,

Todo mundo transmitindo.

Vai passar para todo mundo,

Vovô, vovó, mamãe, papai,

Vou matar os seus queridos,

E lotar os hospitais.

(Refrão)

Vem covidlovers, vem covidlovers,

Se acha fora de perigo e nada vai acontecer

Vem covidlovers, vem covidlovers,

Adoro seu egoísmo, deixar o mundo morrer”

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