O IGP, índice de reajuste inflacionário adotado na maioria dos contratos locatícios, alcançou patamares expressivos de reajuste pela inflação superando a casa dos 20%, fato este que pegou todos os locatários empresários de surpresa.
O aumento expressivo e inesperado do IGP ocorreu porque esse índice é impactado pelas variações das commodities, que são atrelas ao dólar, e no último ano houve forte variação do preço das commodities.
Para se ter ideia da discrepância, outros índices de reajuste monetário não chegaram à metade do IGP. Em indicadores como IPCA, a variação foi de 4,56%; IPCcom 5,63% e INPCcom 5,45%.
Neste momento a pergunta a se faz é unânime: cabe revisão do contrato de locação comercial?
E a resposta é positiva, porém deve-se levar em consideração caso a caso.
Em primeiro lugar, os contratos de locação não residenciais, ditos comerciais, são contratos empresariais e, por isso, asrevisões desses instrumentos são excepcionais.
Contudo, o Código Civil que tem aplicação subsidiária nessas relações contempla exceções que estão alinhadas ao momento atual pandêmico daCovid-19, trata-se da possibilidade de revisão contratual por eventos imprevisíveis e extraordinários previstos em leitura sistemática dos artigos 317 e 478 do Código Civil, que devem ser interpretados a sob a ótica da função social dos contratos, princípio da preservação dos contratos e clausulas gerais da boa-fé objetiva.
É inviável esgotar este debate tão rico neste canal, mas a essência da discussão pela possibilidade da revisão do índice IGP será tratada a seguir:
Quando no curso do cumprimento das obrigações contratuais sobrevém um evento imprevisível e extraordinário, que torna o cumprimento do contrato excessivamente oneroso para uma das partes, esta pode pedir a revisão judicial do contrato.
O objetivo da revisão é restaurar a base do negócio com o reequilíbrio das obrigações em molde similar à que havia na celebração do negócio.
Com isso, a declaração da pandemia em março de 2020 pela Organização Mundial da Saúde e o rápido alastramento do vírus Covid-19, obrigando o fechamento repentino do comércio não essencial,é um acontecimento sem precedentes, não por conta da declaração de pandemia, mas pelas severas medidas restritivas governamentais impostas para contenção do vírus covid-19.
A declaração da pandemia que inicialmente era uma crise sanitária tornou-se também econômica.
É claro que nem todos os setores foram afetados, a indústria farmacêutica, aplicativos de entrega, entre outros, tiveram exponencial crescimento.
Entre os inúmeros prejudicados, destacamos os lojistas “de rua” e os situados em shopping center.
Mas, diferente do que a maioria pensa, o fato imprevisível e extraordinário que dá base para a revisão não é a tão somente a situação de pandemia, mas a demonstração de queda da receita.
Portanto, para conseguir a revisão ou afastamento do IGP do aluguel deve o lojista demonstrar que o evento pandemia covid-19 provocou severa queda na sua receita ocasionada pelas medidas restritivas impostas pelo governo.
Para isso, por exemplo, basta pegar últimos DRE(s) (demonstrativos de resultados do exercícios) anteriores 3 ou 2 anos, e fazer a comparação com a receita do ano de 2020, indicando as despesas operacionais com locação representou por exemplo, em 2018, 2019 a média de X% da receita, e em 2020 representou X+Y% da receita.
Em relação aos lojistas situados em shopping center que possuem apuração do aluguel de forma diferenciada, em muitos casos os shoppings tomam como base o Custo Total de Ocupação (CTO) que varia de 10 a 15% do DRE do locatário, deve-se comprovar elevação do CTO para índices imprevisíveis e extraordinários que pode inviabilizar a operação se for aplicado o IGP.
Logo, a análise jurídica do problema não se limita ao conhecimento técnico da Lei, vai além, exige conhecimento sobre negócios.
Por fim, objetivo do presente artigo não é provocar excesso de litígios judiciais, pelo contrário, é trazer informações e subsídios mínimos para facilitar uma negociação adequada entre locadores de locatários.