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Política

Possível fraude eleitoral pode provocar mudança na Câmara Municipal de São Carlos

23 Jan 2017 - 09h35Por Redação
Promotor de Justiça Marcelo Mizuno. - Promotor de Justiça Marcelo Mizuno. -

Em São Carlos, os dados eleitorais da última eleição municipal demonstraram forte indício de fraude à lei eleitoral da cota de gênero, que determina um mínimo de 30% de candidaturas de mulheres nas chapas proporcionais (para vereador).

A coligação entre os partidos PROS, PEN e PTN que apoiou o então candidato a prefeito e vencedor do pleito realizado no dia 2 de outubro, Airton Garcia (PSB) obteve 2869 votos entre 30 candidatos no total. Dentre as candidaturas, nove eram de mulheres, com a sua maioria (oito) sendo pelo PROS. Destas, seis não obtiveram nenhum voto e uma delas apenas um voto, tendo as outras votação considerada inexpressiva. Além disso, a movimentação financeira zerada em suas contas de candidatas também aponta para uma suposta irregularidade.

Ao tomar ciência de tal situação, o promotor eleitoral Marcelo Mizuno abriu inquérito investigativo no dia 9 de dezembro de 2016. Ele constatou que quatro dessas mulheres candidatas compareceram a votação, mas não tendo sequer votado nelas mesmas. Perante tais indícios de fraude, solicitou ao juiz eleitoral Antonio Benedito Morello a anulação dos votos da coligação e o subsequente recálculo do quociente eleitoral.

O entendimento do promotor é que tais candidaturas foram simuladas apenas para o cumprimento da cota mínima dos 30%, possibilitando que outros homens pudessem lançar suas candidaturas 'reais'. O possível recálculo do quociente eleitoral teria como consequência a mudança de uma das cadeiras na Câmara Municipal de São Carlos.

LEI DE GÊNERO E FRAUDES ELEITORAIS NO BRASIL

No Brasil, apesar das mulheres corresponderem a 51% da população, elas ocupam apenas 10% dos espaços de representação política eletiva no Congresso Nacional. Em São Carlos não é diferente: a cidade jamais teve uma mulher eleita a frente do executivo em seus 150 anos de história e, hoje, tem menos de 10% das vagas ocupadas por elas na Câmara Municipal. Por que isso acontece? É preciso levar em conta que, até bem pouco tempo atrás, as mulheres não tinham direito ao voto, sequer sendo consideradas cidadãs, na ampla acepção do termo.

Além disso, a política institucional sempre refletiu muito da mentalidade dominante de uma época - o Brasil é famoso por seus altos índices de violência contra a mulher; pelas desigualdades de gênero expressas no mercado de trabalho; e pela cultura de que ao gênero feminino correspondem, naturalmente, os trabalhos domésticos e de reprodução da vida cotidiana; dentre diversos outros fatores que demonstram a ainda enorme diferença de tratamento entre homens e mulheres no Brasil.

Para tentar minimizar esse abismo de participação e aumentar a representatividade das mulheres na política - fato de extrema importância para o aperfeiçoamento da nossa democracia -, foi criada a Lei 12.034, 19 de setembro de 2009, que institui que, no processo eleitoral proporcional (vereadores e deputados) um partido deve trazer em sua chapa ao menos 30% de candidatos(as) de um outro gênero. Ou seja: não é mais permitido o lançamento de um conjunto de candidaturas 100% masculinas e nem 100% femininas por uma mesma legenda ou coligação, havendo a obrigatoriedade de uma variação mínima de 30%. Simplificando: se o Partido A visa lançar 10 candidatos homens para concorrer as eleições ele terá, também, que lançar no mínimo 3 mulheres pela mesma legenda - ou contar que outros partidos na mesma coligação lancem tais candidatas.

Essa lei, contudo, não garante espaços efetivos. Como o exemplo da possível fraude em São Carlos mostra, quase nada mudou em questão de representatividade feminina nestas eleições, justamente porque o que ainda leva tempo e precisará de estímulos para mudar é a cultura de participação das mulheres na política, bem como a compreensão do eleitorado de que elas são tão ou mais capazes do que muitos homens para lidar com a 'coisa pública'.

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