sexta, 26 de abril de 2024
Artigo Netto Donato

O fator Brasil e a fraqueza institucional

02 Ago 2018 - 06h50Por (*) Netto Donato
O fator Brasil e a fraqueza institucional -

É comum observar no Brasil alguém tentando utilizar uma solução mais fácil para um problema complexo, buscando atalhos, brechas, contatos para ter o seu pleito satisfeito. É o conhecido “jeitinho brasileiro”, ou fator Brasil, que na definição de Lívia Barbosa “é sempre uma forma ‘especial’ de se resolver algum problema ou situação difícil ou proibida; ou uma solução criativa para alguma emergência, seja sob a forma de conciliação, esperteza ou habilidade.”

Uma das origens do fator Brasil, de acordo com o historiador Sergio Buarque de Holanda, está na cordialidade do brasileiro. A palavra cordial vem do latim cordis, que significa coração. Desta forma, a pessoa cordial não é aquela gentil, mas sim que age com o coração, colocando a emoção no lugar da razão, colocando as formalidades para escanteio e sem fazer a distinção entre o público e o privado, para atender seus interesses.

Neste ponto, quando não há distinção entre o público e o privado, observamos grande problemas, com graves consequências para a população. É a abertura para políticos oportunistas utilizarem o poder concedido pelo povo, através das eleições, para agirem buscando aumentar o próprio patrimônio ou favorecer pessoas próximas, através de benesses no setor público.

Para que tais artimanhas não enfrentem grandes riscos de serem descobertas e punidas, órgãos de controle e do Judiciário começam a ter sua atuação prejudicada, através do aparelhamento empreendido por governantes e parlamentares instalados há um bom tempo nos governos, sobretudo locais. Além disso, possíveis endurecimentos de leis no combate à corrupção e fraudes na gestão pública perdem força ao serem apreciados pelas casas legislativas.

O instinto de sobrevivência e autopreservação, criados pelo fator Brasil, culminam em um ambiente institucional bastante enfraquecido, no qual não há previsibilidade e transparência das regras vigentes, e no qual o compadrio seja o critério determinante para o sucesso ou insucesso de empreendimentos. Como resultados, observamos o Brasil em 96º lugar no Ranking Internacional de Transparência.

Além disso, há um efeito grave na ineficiência da nossa economia. De acordo com estudo da FIESP, o custo médio da corrupção no Brasil, em 2010, foi estimado entre 1,38% a 2,3% do PIB. O total inclui tanto o dinheiro desviado, quanto o potencial de expansão econômica desperdiçado. Em outro estudo, realizado pela Fundação Getúlio Vargas, o Brasil ficou em 50º lugar, num ranking de 68 países, que media a produtividade da economia. Segundo os dados, um trabalhador brasileiro produz apenas um quarto do que produz um trabalhador norte-americano no mesmo intervalo de tempo.

Entretanto, após a Operação Lava Jato, que trouxe à tona esquemas vultuosos de corrupção, punindo políticos e empresários envolvidos; a decisão do Supremo Tribunal Federal em restringir o foro privilegiado e o aperfeiçoamento nas regras para indicação de diretores em empresas estatais apontam que uma mudança profunda pode estar acontecendo na sociedade brasileira, que deixe o fator Brasil para trás, definitivamente.

(*) O autor é advogado, especialista em Direito Público e mestre em Gestão e Políticas Públicas, na Fundação Getúlio Vargas - FGV/SP.

O exposto artigo não reflete, necessariamente, o pensamento do São Carlos Agora.

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