O "25 de Novembro de 1975" - Entre a Revolução e a consolidação da democracia em Portugal
21 NOV 2025 • POR Rui Sintra • 15h04O “25 de Novembro de 1975”, em Portugal, é considerado pela historiografia contemporânea um dos momentos decisivos do processo de transição democrática. Se o “25 de Abril de 1974” simbolizou o derrube da ditadura e o início da liberdade, o “25 de Novembro” do ano seguinte representou o momento em que se definiu o rumo do regime democrático, afastando a hipótese de uma deriva revolucionária de caráter autoritário.
Após a “Revolução dos Cravos”, Portugal viveu um período de intensa convulsão social e política, conhecido como Processo Revolucionário em Curso (PREC). Durante esse tempo, diferentes forças disputavam a orientação do país. De um lado, setores ligados ao Partido Comunista Português (PCP) e à extrema-esquerda defendiam a radicalização das medidas revolucionárias, com forte inspiração nos modelos do socialismo real. Do outro, partidos moderados como o PS (Partido Socialista), o PPD/PSD e o CDS, apoiados por correntes militares moderadas, buscavam assegurar um regime pluralista e de democracia representativa.
As Forças Armadas, protagonistas do “25 de Abril”, encontravam-se profundamente divididas. O Conselho da Revolução e o Movimento das Forças Armadas (MFA) estavam fragmentados entre moderados e revolucionários, o que gerava grande instabilidade. O período foi marcado por greves, ocupações de terras no Alentejo, nacionalizações de empresas estratégicas e frequentes manifestações populares, refletindo uma sociedade polarizada e em ebulição.
No campo revolucionário, destacavam-se figuras como Otelo Saraiva de Carvalho, então comandante do COPCON (Comando Operacional do Continente), que mantinha grande influência sobre setores militares mais radicalizados. Do lado moderado, surgiram nomes como António Ramalho Eanes, oficial que assumiria papel de liderança no “25 de Novembro”, garantindo a supremacia da ala democrática.
Também os partidos políticos tiveram papel central. O PS — de Mário Soares — foi um dos mais firmes defensores de uma via democrática e europeísta, em oposição ao PCP — de Álvaro Cunhal —, que via o processo revolucionário como oportunidade de transformação estrutural profunda da sociedade portuguesa. A tensão entre socialistas e comunistas, aliada à cisão nas Forças Armadas, foi determinante para a escalada de acontecimentos que culminou no “25 de Novembro”.
Na madrugada de 25 de Novembro de 1975, setores militares ligados ao COPCON e a unidades paraquedistas desencadearam ações que foram interpretadas como uma tentativa de insurreição revolucionária. A resposta veio pela mão de militares moderados, apoiados por Ramalho Eanes, que rapidamente conseguiram neutralizar a ameaça. O episódio terminou com a prisão de diversos oficiais mais radicalizados e com a afirmação da linha moderada dentro do MFA. A intervenção militar evitou o risco de uma guerra civil e permitiu retomar o caminho da institucionalização democrática.
O “25 de Novembro” teve consequências profundas. A partir dele, abriu-se caminho para a aprovação da Constituição de 1976, que consagrou a democracia pluralista, os direitos fundamentais e o papel dos partidos políticos. Ramalho Eanes viria a ser eleito o primeiro Presidente da República em regime democrático, tornando-se figura central da estabilização institucional.
Se o “25 de Abril” representou a libertação do jugo ditatorial, o “25 de Novembro” representou a escolha da via democrática, afastando o risco de totalitarismos, fossem de direita ou de esquerda. A data marcou o fim do PREC e o início de uma fase de maior equilíbrio, em que o poder regressou progressivamente à sociedade civil e às instituições políticas eleitas.
Hoje, cinquenta anos depois, o “25 de Novembro” é recordado como momento charneira da história contemporânea de Portugal. Para uns, foi a "vitória da democracia sobre o radicalismo"; para outros, uma "correção de rumos" que pôs termo a um processo revolucionário inacabado. Independentemente das leituras políticas, a data consolidou a democracia portuguesa e preparou o país para a integração europeia e para a modernização institucional que marcaria as décadas seguintes, independente dos problemas gerados e das dificuldades encaradas nesse percurso, similares ao de qualquer nação democrática.