Polêmica

Proposta sobre CNH faz movimento despencar em autoescolas de São Carlos

Mudanças na CNH podem causar demissão de 150 trabalhadores em São Carlos

16 OUT 2025 • POR Da redação • 14h49
Local de treinamento de futuros motoristas em São Carlos - arquivo

Desde que o Ministério dos Transportes abriu uma consulta pública, no dia 2 de outubro, com o objetivo de modificar as regras para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), as 18 autoescolas de São Carlos viram seus alunos desaparecerem bruscamente. Sem receita para continuar tocando seus negócios, os proprietários das empresas já projetam a demissão de cerca de 150 trabalhadores, entre eles monitores e funcionários do setor administrativo, entre outros.

“Normalmente, em meados do mês, eu teria de 16 a 18 matrículas de novos alunos. Mas, depois do anúncio dessas mudanças, até agora, em outubro, eu só fiz uma matrícula. A demanda despencou, pois as pessoas que iriam tirar a CNH agora estão em dúvida, esperando para ver o que acontece. Virou uma bagunça geral e nosso medo é termos que demitir nossos funcionários”, afirma o presidente da Associação das Auto Moto Escolas de São Carlos, Osvaldo de Oliveira Gonçalves, que representa 18 Centros de Formação de Condutores.

A proposta, segundo a pasta, prevê que o candidato possa escolher diferentes formas de se preparar para os exames teórico e prático, que continuarão obrigatórios como condição para a emissão da CNH.
“Se atualmente, com 20 aulas práticas para os alunos conseguirem conquistar a CNH, já temos um trânsito com um número absurdo de acidentes, imagine o que vai acontecer se zerar tudo e acabar com as autoescolas”, afirma Gonçalves.
Ele teme a extinção das autoescolas, caso a medida seja confirmada. “Se acabarmos com as autoescolas, a tendência é um trânsito ainda mais inseguro e letal”, conclui.

Antônio Coca Pinto Ferraz, professor do Departamento de Transporte da USP, é contra a proposta do governo federal. “Se a medida do governo for confirmada, será uma forma equivocada de lidar com o suposto problema. Se o custo para o brasileiro conseguir a habilitação é alto, a saída é, de alguma forma, atuar na redução desse valor, seja com redução de impostos, seja com subsídios. Se hoje, com a formação que existe, já temos um dos trânsitos que mais matam no mundo, imagine se tivermos menos aulas ou não tivermos mais aulas. Como especialista nesse tema, sou contra essa mudança”, comenta.

Hoje, para uma pessoa conseguir tirar a CNH, entre aulas práticas, teóricas e os exames necessários, gasta entre R$ 3 mil e R$ 4 mil, dependendo se a autorização é somente para automóvel ou também para motocicleta e da modalidade da autorização.

REAÇÃO — A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), por meio do seu Conselho de Serviços, e o Sindicato das Auto Moto Escolas e Centros de Formação de Condutores no Estado de São Paulo (Sindautoescola.SP) defendem a manutenção da formação obrigatória em Centros de Formação de Condutores (CFCs), com curso teórico de 45 horas-aula e, no mínimo, 20 horas práticas, diante da proposta do governo federal de flexibilizar essas exigências.

Para o setor, a medida ameaça a qualidade da formação, fragiliza a segurança no trânsito e põe em risco milhares de empresas e empregos no Estado de São Paulo, além de transferir ao setor privado responsabilidades que deveriam ser compartilhadas pelo Poder Público. O tema foi discutido durante a reunião ordinária do Conselho de Serviços, realizada em 18 de agosto, que contou com a participação do presidente do Sindautoescola.SP, José Guedes Pereira.

FORMAÇÃO NÃO É BUROCRACIA, MAS SEGURANÇA PÚBLICA — Hoje, a formação de condutores é regulada pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran) e realizada em CFCs credenciados. O pacote obrigatório, que reúne aulas teóricas e práticas, existe para garantir que o novo motorista compreenda a legislação e os riscos de dirigir antes de circular de forma autônoma.
“Não somos contra modernizar o processo, mas não se pode desmontá-lo. Flexibilizar sem critério significa precarizar a atividade e pôr a sociedade em risco”, afirmou Pereira.

Em São Paulo, o setor é formado por cerca de 3,1 mil empresas, que empregam 25 mil pessoas e operam uma frota de 30 mil veículos voltados para o treinamento. Essa cadeia de negócios, que tem capilaridade em todo o Estado, depende de segurança jurídica para manter empregos e atrair investimentos. “Precisamos melhorar o sistema, e não acabar com ele”, destacou o presidente do sindicato.

Segundo o Sindautoescola.SP, o custo médio da primeira habilitação nas categorias A ou B é de aproximadamente R$ 1,9 mil. Desse valor, um terço corresponde a taxas públicas, como exames, emissão de documentos e até a entrega via Correios. O setor reivindica que a discussão sobre custos passe pela revisão dessas cobranças, e não apenas pela redução das aulas, como sugere o governo.

MOBILIZAÇÃO INSTITUCIONAL — Com o respaldo da FecomercioSP, por meio do seu Conselho de Serviços, o Sindautoescola.SP participou, no último dia 13, do lançamento da Frente Parlamentar em Defesa da Educação para o Trânsito e da Formação de Condutores, em Brasília. O movimento articulou parlamentares de diferentes partidos, reforçando a necessidade de segurança jurídica para autoescolas e instrutores.

20 MILHÕES NAS RUAS SEM CNH — A ideia do governo federal é retirar a obrigatoriedade de contratação de autoescolas por parte dos candidatos, que poderão escolher contratar instrutores autônomos credenciados.

“Hoje, os altos custos e a burocracia impedem milhões de pessoas de ter a habilitação. Vinte milhões de brasileiros dirigem sem carteira, porque o modelo atual é excludente, caro e demorado demais”, afirmou o ministro dos Transportes, Renan Filho, em postagem nas redes sociais para divulgar a iniciativa.
“Com a nova proposta, o cidadão terá mais liberdade para escolher como se preparar para as provas do Detran, de forma mais personalizada e acessível. O objetivo do governo é democratizar o acesso à CNH, ampliar a inclusão e tornar o trânsito mais seguro no país”, acrescentou.

A expectativa do governo é que a flexibilização na formação de novos motoristas reduza o custo da CNH, que atualmente pode ultrapassar R$ 3,2 mil, segundo o Ministério dos Transportes.
A minuta do projeto ficará disponível por 30 dias na plataforma Participa + Brasil e, depois, seguirá para análise do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Durante esse período, qualquer cidadão poderá enviar sugestões e contribuições.

MUDANÇAS — Entre as alterações propostas está justamente o fim da exigência de carga horária mínima de 20 horas-aula práticas. O candidato poderá escolher como fará sua preparação, contratando um centro de formação de condutores ou um instrutor autônomo.
Os instrutores deverão ser credenciados pelos Departamentos de Trânsito (Detrans) dos estados. A Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) permitirá a formação desses profissionais por cursos digitais.
A projeção do governo federal é que o custo para obtenção da CNH poderá cair em até 80%, resultado da ampliação das formas de oferta da formação teórica, inclusive em formatos digitais, e da dispensa da carga horária mínima nas aulas práticas.

A PROPOSTA DO GOVERNO — O governo federal está propondo mudanças no processo de obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). A principal delas é o fim da obrigatoriedade de frequentar aulas de autoescola na preparação para os exames teórico e prático dos Departamentos de Trânsito (Detrans) estaduais.
Com isso, o custo para tirar o documento, que hoje chega a R$ 3,2 mil, poderá cair em até 80%.