São Carlos tem média de suicídios acima da nacional
Taxa média de casos no Brasil é entre 6 e 7 por 100 mil habitantes ao ano; em São Carlos, chegou a 9,8 em 2024
13 SET 2025 • POR Da redação • 07h56O registro de 26 suicídios em São Carlos em 2024 revela uma situação preocupante, já que corresponde a 9,8 casos por 100 mil habitantes. A taxa média anual de suicídios no Brasil varia entre 6 e 7 casos por 100 mil habitantes.
“Esse índice deve ser observado com atenção, especialmente porque a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que números elevados de suicídio configuram um problema de saúde pública. É importante ressaltar que, por trás de cada um desses 26 casos, existem pessoas, famílias e uma rede social que sofre. A taxa de São Carlos em 2024 ficou acima da média nacional, o que reforça a necessidade de campanhas de prevenção e do acesso a serviços de saúde mental na cidade”, afirma a psicóloga Dra. Aleksandra Lopes (CRP 6/123404), especialista em Psicanálise e Saúde pelo Instituto de Ensino e Pesquisa Albert Einstein.
Em entrevista exclusiva ao SÃO CARLOS AGORA, ela fala sobre o Setembro Amarelo e os meios de prevenir o suicídio.
SÃO CARLOS AGORA – Qual é a importância do Setembro Amarelo?
DRA. ALEKSANDRA LOPES – O Setembro Amarelo é uma campanha mundial de prevenção ao suicídio. Seu principal objetivo é quebrar o silêncio, diminuir o estigma e incentivar o diálogo aberto sobre saúde mental.
Essa iniciativa é fundamental por vários motivos:
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Conscientização social: muitas pessoas ainda encaram o suicídio com preconceito ou evitam falar sobre ele. A campanha traz o assunto para o espaço público, mostrando que conversar e buscar ajuda é essencial e pode salvar vidas.
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Apoio e acolhimento: estimula familiares, amigos e a sociedade a ouvirem sem julgamentos, criando uma rede de apoio para quem sofre em silêncio.
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Identificação de sinais de alerta: ajuda a reconhecer indicadores de sofrimento emocional, como isolamento, desespero, mudanças bruscas de comportamento ou falas sobre morte.
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Valorização da saúde mental: reforça que ela é tão importante quanto a saúde física e que buscar ajuda profissional não é sinal de fraqueza, mas de coragem.
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Divulgação de recursos de ajuda: informa onde procurar apoio, como o CVV (Centro de Valorização da Vida), que atende pelo número 188, disponível 24 horas.
Por fim, o Setembro Amarelo combate tabus. Falar sobre suicídio de forma responsável não o incentiva, mas o previne. O silêncio, sim, aumenta o risco.
SCA – O que leva uma pessoa ao suicídio?
DRA. ALEKSANDRA – O suicídio resulta de uma combinação de fatores complexos. Não existe uma única causa, mas alguns elementos são comuns:
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Sofrimento psíquico intenso: a pessoa sente um desespero profundo, vazio, solidão e perda total do sentido da vida, acreditando que nada mudará.
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Transtornos mentais: condições como depressão, transtorno bipolar, esquizofrenia e ansiedade estão ligadas ao risco elevado. O uso abusivo de álcool e drogas também agrava o quadro.
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Em muitos casos, o transtorno não é tratado adequadamente, o que intensifica o sofrimento e aumenta o risco.
O suicídio, muitas vezes, é a manifestação extrema de uma doença mental não diagnosticada ou não tratada.
SCA – Como a saúde mental é tratada no Brasil?
DRA. ALEKSANDRA – A saúde mental é um direito garantido pelo SUS, mas ainda enfrenta desafios. Desde a Reforma Psiquiátrica (Lei 10.216/2001), o Brasil busca substituir o modelo hospitalocêntrico por uma rede de atenção comunitária.
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Rede de Atenção Psicossocial (RAPS): integra serviços como os CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), Unidades Básicas de Saúde, hospitais gerais com leitos psiquiátricos, Consultórios na Rua e serviços de urgência, como o SAMU.
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Tratamento multiprofissional: envolve psicólogos, psiquiatras, enfermeiros, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais, priorizando a reinserção social e a redução de danos.
Avanços: acesso gratuito, campanhas como o Setembro Amarelo e programas em escolas, empresas e comunidades.
Desafios: falta de profissionais em algumas regiões, filas longas, estigma persistente e subfinanciamento.
SCA – A senhora é contra a divulgação de notícias de suicídio?
DRA. ALEKSANDRA – Não é uma questão de ser contra ou a favor, mas de responsabilidade.
Vantagens da divulgação responsável:
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Conscientização: mostra que o suicídio é problema de saúde pública.
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Educação: informa sobre sinais de alerta e onde buscar ajuda.
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Acolhimento social: pode gerar empatia e apoio.
Riscos da divulgação inadequada:
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Detalhar métodos pode incentivar a imitação.
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Romantizar o ato pode transformá-lo em falsa solução.
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Simplificar causas ignora a complexidade do problema.
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Expor números sem contexto pode gerar mais desespero.
SCA – Qual a relação de drogas e álcool com o suicídio?
DRA. ALEKSANDRA – O álcool e drogas como cocaína e anfetamina afetam o sistema nervoso central, diminuindo o autocontrole e aumentando a impulsividade. Isso pode levar a decisões imediatas e fatais, que não seriam tomadas em estado de sobriedade.
SCA – São Carlos registrou 26 suicídios em 2024. Esse número é alto?
DRA. ALEKSANDRA – Sim, considerando a população estimada de 265.294 habitantes, a taxa é de 9,8 por 100 mil, acima da média nacional de 6 a 7.
Cada caso representa vidas e famílias afetadas. Por isso, reforça-se a importância da prevenção e do acesso a serviços de saúde mental.
SCA – Como o SUS ajuda quem não pode pagar tratamento?
DRA. ALEKSANDRA – O SUS garante acesso gratuito a terapias e medicamentos, inclusive de alto custo. Sem ele, muitos não teriam condições de se tratar. O sistema assegura dignidade e igualdade no direito à saúde.
SCA – O acompanhamento é contínuo?
DRA. ALEKSANDRA – Sim. Após o primeiro atendimento, o paciente pode ser acompanhado regularmente, com fornecimento gratuito de medicamentos e participação em grupos terapêuticos e oficinas.
SCA – O tratamento pelo SUS tem qualidade?
DRA. ALEKSANDRA – Sim. O SUS conta com profissionais especializados em CAPS e em equipes multiprofissionais. O diferencial é a abordagem coletiva, que vai além do atendimento individual.
SCA – Depressão é falta de Deus?
DRA. ALEKSANDRA – Não. A depressão é uma doença mental complexa, causada por desequilíbrios químicos, fatores genéticos e ambientais. Dizer que é “falta de Deus” não tem base científica e pode atrasar o tratamento adequado.
Assim como outras doenças, como câncer ou diabetes, a depressão precisa de tratamento médico e terapêutico.