Especialista diz que partidos definem mais que votos locais eleição de deputados em São Carlos
Jornalista João Marcos Gomide explica que, para ter mais chances, candidatos terão que galgar ser "prioridades" de seus partidos políticos
5 SET 2025 • POR Da redação • 08h56Ter uma votação maciça em São Carlos é importante, mas não é o fator determinante para que um candidato a deputado estadual ou federal se eleja em 2026. Muito mais fundamental que isso é o candidato ser colocado como “prime”, ou seja, como prioridade do partido, o que leva a agremiação a organizar recursos, cabos eleitorais relevantes e situações que destaquem esse concorrente. A reflexão é do jornalista João Marcos Gomide, que atuou no Grupo Globo por mais de 30 anos e é estudioso do tema. Ele cita o caso da deputada estadual Thainará Faria, de Araraquara. Ela recebeu 91.381 votos no Estado de São Paulo, sendo apenas 17.871 — ou 21% do total — em Araraquara. Thainará conquistou, só na capital paulista, 27.086 votos, expressivos 30% de sua votação total e quase 10 mil a mais do que em sua cidade.
SÃO CARLOS AGORA – Uma das grandes chances de São Carlos eleger um deputado é que os são-carlenses que estiverem na disputa se credenciem como "candidatos primes" ou "prioritários" dos partidos, aqueles que têm cabos eleitorais e votos em todo o Estado. Você acha que algum dos pré-candidatos de São Carlos pode obter esse status?
JOÃO MARCOS GOMIDE – Em tese, sim. A direção estadual do partido pode pedir votos para quem tem maior potencial no Estado. Vimos na eleição de 2022 que os candidatos a deputado estadual em São Carlos tiveram poucos votos em outras cidades.
Por exemplo, o candidato Júlio César, do PL, foi o 181º mais votado, com 29.209 votos. Em São Carlos, foi o mais votado, com 21.128 votos — 72% do total.
O candidato Djalma Nery, do PSOL, foi o 215º mais votado, com 21.380 votos. Em São Carlos, recebeu 12.100 — 56% do total.
Os dois ficaram muito distantes dos deputados estaduais eleitos. O 70º candidato que entrou recebeu 45.094 votos.
Veja os 6 candidatos a deputado estadual mais votados em São Carlos:
1º Júlio César (PL): 21.128
2º Djalma Nery (PSOL): 12.100
3º Roselei Françoso (MDB): 9.469
4º Élton Carvalho (Republicanos): 6.994
5º Eduardo Suplicy (PT): 4.140
6º Dé Alvim (Solidariedade): 2.796
SCA – Thainará Faria teve uma votação até pífia em Araraquara, sua base, mas foi votada em centenas de cidades. Ser votado em várias regiões do Estado é mais importante do que uma votação maciça na própria cidade de domicílio eleitoral?
GOMIDE – O deputado estadual eleito precisa muito de votos de outras cidades. Só depender da base eleitoral é insuficiente na maioria dos casos.
Por exemplo, Araraquara teve duas deputadas estaduais eleitas pelo PT em 2022. A deputada Márcia Lia (39ª mais votada) recebeu 108.587 votos no Estado de São Paulo. Em Araraquara, obteve 11.139 votos — apenas 10% do total.
Já a deputada Thainará Faria (51ª mais votada) recebeu 91.381 votos no Estado. Em Araraquara, obteve 17.871 votos — apenas 21% do total. Só na cidade de São Paulo, recebeu 27.086 votos, expressivos 30% do total. Muitos desses votos resultam do trabalho do partido.
SCA – Dorival Braga, em 1994 e 1998, se elegeu deputado estadual concentrando seus votos em sua cidade, Porto Ferreira (75% dos votos), Descalvado (50%), Santa Rita do Passa Quatro, Pirassununga e Santa Cruz das Palmeiras, praticamente cinco municípios. O senhor acha que essa estratégia já não serve mais?
GOMIDE – Para cidades menores, dificilmente dará a eleição. Veja o exemplo do ex-prefeito de Votuporanga, Carlão Pignatari, do PSDB. Ele recebeu 105.245 votos. De sua cidade [96 mil habitantes], muito menor do que São Carlos, obteve 18.646 votos — 17% do total. Foi eleito com votos de outras cidades de São Paulo.
SCA – As igrejas, principalmente as evangélicas, elegem muitos deputados. Por que nenhuma delas consegue eleger um candidato da cidade, com votação forte em São Carlos e em todo o Estado, já que estão presentes em praticamente todos os 645 municípios paulistas?
GOMIDE – Para isso dar certo, todas as igrejas teriam que concentrar votos em um determinado número de candidatos. Não é o que acontece. Cada cidade escolhe o seu candidato, e a votação local se enfraquece.
SCA – A política de São Carlos tem uma dinâmica que chega a ser curiosa. Estou cansado de ver políticos que dão entrevistas falando que a cidade deve ter menos candidatos para conseguir finalmente eleger deputados. Porém, esses mesmos políticos, que defendem a redução, já concedem a entrevista se colocando como pré-candidatos, contradizendo o que acabaram de pregar. Como o senhor vê essa hipocrisia política?
GOMIDE – É direito de cada partido e de cada candidato da cidade disputar a eleição. Não vai funcionar essa tese de que São Carlos deve lançar só um ou dois candidatos para sair daqui com milhares de votos. Só vai funcionar se o candidato e, principalmente, o partido, trabalharem sua candidatura no Estado de São Paulo. Cerca de 25 candidatos em 2022 receberam entre 50 mil e 66 mil votos e não foram eleitos, acabando como suplentes.