"Ele não matou só a Daiana, matou todos nós", diz irmã de vítima de feminicídio em São Carlos
Segundo sua irmã, Daiana deveria voltar para São Paulo nesta sexta-feira, 1º de agosto, para recomeçar a vida na capital paulista.
31 JUL 2025 • POR Marco Rogério • 18h44Em entrevista exclusiva ao SÃO CARLOS AGORA, a paulistana Diana Miranda, irmã de Daiana da Silva Miranda Figueiredo, de 38 anos, assassinada na última terça-feira, 28 de julho, no Jardim Medeiros, em São Carlos, revela detalhes do relacionamento do casal e afirma que os problemas do ex-marido e assassino, Fábio Dias de Figueiredo, de 41 anos, com drogas começaram ainda quando o casal morava em São Paulo.
Fábio foi preso em flagrante acusado de matar a esposa, Daiana da Silva Miranda Figueiredo, de 38 anos, dentro da residência do casal no prolongamento do Jardim Medeiros, em São Carlos. O crime foi registrado como feminicídio e violência doméstica, com agravante por ter ocorrido na presença dos filhos da vítima.
Diana com a irmã Daiana e outra irmã: “É uma história que eu não gostaria nunca de contar. A minha mãe está com o coração dilacerada. As crianças não tiram isso da cabeça e sabem que o pai matou a mãe deles. É tudo muito triste”
SÃO CARLOS AGORA – Que lembranças ficaram da Daiana?
DIANA MIRANDA – Da minha irmã só tenho coisas boas para falar. Somos uma família de sete irmãos, dois homens e cinco mulheres. Eu sou a mais velha das cinco e a Daiana, na infância, foi muito reservada, nunca deu trabalho e sempre foi estudiosa. Cada uma das irmãs tem sua personalidade própria. Ela era uma das mais calmas e serenas da família. Eu me casei em 2001 e foi no meu casamento que ela conheceu o Fábio e começou a namorá-lo. Com o tempo, ela foi morar com ele e com a família dele, aos 16 anos, por decisão dela. Nossa família não questionou, pois era o que ela queria. O Fábio foi o primeiro namorado e marido. Ela casou e foi viver a vida dela como todos seguiram a sua.
SCA – E quando o relacionamento começou a ficar complicado?
DIANA – Nos primeiros dois anos, formavam um casal feliz e moravam perto da gente. Depois, ela foi morar sozinha em uma região de São Paulo, agora mais próxima de mim. A partir daí, começamos a notar um comportamento estranho por parte do Fábio. Ela começou a contar algumas coisas de que não gostava. Um dia, ao lavar as roupas dele, descobriu que ele estava usando drogas. Ele trabalhava à noite. Aí começou o sofrimento dela. Passaram cerca de três anos em São Paulo e ele fez dívidas por causa das drogas. O objetivo foi morar longe da família, porque a dele atrapalhava, dizendo que ela tinha que cuidar dele e aceitar.
Depois decidiram recomeçar em outro lugar, longe da família dele, e foram para São Carlos. Em setembro completariam 15 anos vivendo em São Carlos. Ele parou com as drogas, mas depois descobrimos que a estava agredindo. Chegou a acorrentá-la e ameaçá-la com uma faca. As pessoas perguntam por que permitimos isso. Não é que permitimos. Aconselhamos que voltasse para São Paulo e se separasse dele, mas ela acreditava muito na recuperação dele e queria ser mãe. Foi mãe depois de dez anos. O sonho dela era que o filho fosse a motivação para que o Fábio largasse o vício e formassem uma família de verdade.
Desde São Paulo, quando os problemas começaram, tentamos ajudá-lo. Eu fiquei viúva e meu marido era muito amigo dele. Chegamos a internar o Fábio, mas não tivemos sucesso. Em São Carlos, ele passou por dez clínicas ao longo dos 24 a 25 anos de relacionamento. Nada adiantou. Ela lutou até o fim para salvar o casamento. Depois de três anos, ela teve uma filha e colocou o nome de Fábia Esperança. Ela tinha muita esperança. Era uma mulher guerreira, trabalhadora, fiel, não bebia, não fumava e vivia para a família. Mesmo com dor, acreditava na restauração do casamento. Tinha fé que ele largaria as drogas.
Parte da família dele a pressionava, dizendo que, se ela se separasse, ele se mataria. Ela se sentia aprisionada, com medo, temia ser julgada. E os anos passaram.
SCA – E o que aconteceu depois?
DIANA – Ela resolveu se separar. Sempre gostou de resolver os próprios problemas, não gostava de muita interferência. E respeitávamos isso. Ela nunca fez mal a ninguém. Morreu defendendo os filhos. Pelo que sei, ela disse para eles: "Corram, peçam ajuda, saiam daqui". Vizinhos confirmam isso. Ela morreu para salvar os filhos. A intenção dele não era só matá-la, mas também os filhos. Talvez quisesse impor sofrimento, fazendo-a ver os filhos sendo mortos. Foi algo premeditado.
Faz dois meses que falei com ela. Tive um sonho e perguntei se estava tudo bem. Ela disse que estava separada e que o Fábio estava internado numa clínica psiquiátrica. Ela dizia que estava fazendo a parte dela, pagando a clínica.
SCA – Ela iria voltar para São Paulo?
DIANA – Para ela, o relacionamento já tinha acabado. No sábado, dia 26, alguém da clínica ligou dizendo que ele receberia alta. Ela estava com as malas prontas para chegar nesta sexta-feira, 1º de agosto. Já havia pedido demissão, estava no aviso prévio. Queria recomeçar a vida em São Paulo. Ele não viria porque era visado por traficantes e temia morrer.
Essa tragédia foi um fim drástico e inesperado. Minha mãe teve que buscá-la em um caixão. Foi uma morte dolorosa, cruel. Nunca imaginei ver minha irmã toda roxa e marcada. Ela foi uma ótima mãe. Um dos filhos, Samuel, de 8 anos, é autista. Ela sempre quis o melhor para os filhos. Estava estudando, formada em pedagogia, cursava logística e era encarregada em uma empresa de limpeza que prestava serviço ao SESC.
Ela deixou tudo isso para trás. Uma vida interrompida. Não verá os filhos crescerem. Mas salvou os filhos. Vizinhos disseram que ele saiu para a rua gritando com a faca, chamando os filhos. Queria matá-los também. Mas Deus não permitiu.
A polícia chegou rápido. Ele resistiu, mas foi preso em flagrante. Espero que continue preso. Essa é a história dela. Uma história que eu nunca gostaria de contar. Minha mãe está com o coração dilacerado. As crianças viram tudo e sabem que o pai matou a mãe. É tudo muito triste.
SCA – O que você espera de São Carlos com relação à Daiana?
DIANA – Espero que ela seja lembrada. Que receba uma homenagem. Que tenha o nome em uma rua, em uma instituição. Ela combateu o bom combate, completou a carreira, guardou a fé. Deixou um legado. Foi uma mulher guerreira, que nunca deu trabalho.
Infelizmente, convivemos pouco, pois ela morava longe. Mas os poucos momentos foram felizes. Espero que São Carlos não a esqueça. Que ela seja lembrada, quem sabe nomeando uma Casa da Mulher. Mesmo depois de morta, ela pode fazer a diferença. Ela é o grito de socorro de muitas mulheres que sofrem caladas.