quinta, 25 de abril de 2024
“Pandemia não acabou”

Infectologista da Santa Casa alerta: não é hora para afrouxamento

Com a aproximação das festas de final de ano, Roberto Muniz Jr teme que o relaxamento aja como uma “bomba relógio”, caso ocorram muitas aglomerações durante o Natal e o Ano Novo

08 Dez 2020 - 06h24Por Marcos Escrivani
Muniz Junior: "A infecção afeta mais os idosos, neste momento, porque os outros membros da família estão se expondo e trazendo a doença para casa" - Crédito: DivulgaçãoMuniz Junior: "A infecção afeta mais os idosos, neste momento, porque os outros membros da família estão se expondo e trazendo a doença para casa" - Crédito: Divulgação

O recente aumento de mortes em São Carlos, quando quatro idosos foram vítimas da Covid-19 e no final de semana, mais dois óbitos devido à infecção foram notificados pela Vigilância Epidemiológica, é um sinal de alerta de que, além de pandemia não ter acabado, uma possível segunda onda não está descartada.

O alerta foi feito em entrevista ao São Carlos Agora pelo infectologista e gerente médico da Santa Casa de São Carlos, Roberto Muniz Junior.

Médico infectologista pelo Instituto de Infectologia Emilio Ribas, ele faz parte do corpo clínico dos Hospitais Israelita Albert Einstein, São Luiz (unidade Itaim) e atua na Unidade de Terapia Intensiva do Instituto de Infectologia Emilio Ribas, em São Paulo.

Muniz Junior salientou inicialmente que a Covid-19 não escolhe idade ou sexo e que as vítimas continuam sendo as que estão no grupo de risco (acima de 60 anos) e as que possuem comorbidades. Sobre o fato de idosos estarem indo à óbito, na sua opinião, é que os jovens podem ser os responsáveis, ao levar o novo coronavírus para dentro das residências onde moram.

“BOMBA RELÓGIO”?

Salientando que a Santa Casa segue com mais de 60% de ocupação de leitos Covid, Muniz Junior disse que é observado um novo pico da doença, provavelmente associado ao relaxamento do distanciamento social, devido aos feriados prolongados.

Com a aproximação das festas de final de ano, o infectologista teme que o relaxamento aja como uma “bomba relógio”, caso ocorra muitas aglomerações durante o Natal e o Ano Novo.

“É preciso que as pessoas entendam que a pandemia não acabou. Que ainda não é hora de relaxar. Se a população não retomar os cuidados necessários, o que podemos ter, depois das festas de fim de ano, UTIs lotadas e a perda de muitas vidas”, ponderou.

A ENTREVISTA

São Carlos Agora - De acordo com o Info Tracker, ferramenta que monitora o avanço dos casos de Covid-19 no país, nos últimos sete dias, São Carlos foi a segunda cidade no Estado em número de mortes. Qual motivo plausível fez com que isso ocorresse?

Roberto Muniz Junior - O Info Tracker aponta nos últimos 7 dias, que o número de mortes em São Carlos aumentou 6,67%, passando de 60 para 64 óbitos. Com essa porcentagem de aumento, fica atrás de Itapeva, que registrou 29,03% a mais de óbitos no mesmo período, subindo de 31 para 40 mortes. Ainda não podemos chamar de aceleração da taxa de contaminação, mas há um pico maior do que o que estávamos observando. Com isso, pode se chegar à conclusão de que o afrouxamento do distanciamento social no período é responsável pelo número de casos e óbitos

SCA - Do dia 28 de novembro até 3 de dezembro, foram 4 mortes, com pacientes acima de 60 anos. De fato a infecção está afetando mais os idosos neste momento?

Muniz Junior - A infecção afeta mais os idosos, neste momento, porque os outros membros da família estão se expondo e trazendo a doença para casa. Afetando aqueles que são mais vulneráveis.

SCA - Permanece ainda a ideia inicial do grupo de risco (acima de 60 anos) e das comorbidades ou o Sars-CoV-2 tem matado pessoas de todas as idades?

Muniz Junior - Os grupos de risco continuam os mesmos. Idosos, hipertensos, diabéticos e cardiopatas são os mais afetados, inclusive com maior chance de gravidade.

SCA - Hoje, qual a real situação da Covid-19 em São Carlos? A tendência é de crescimento dos casos? Como está a ocupação na Santa Casa?

Muniz Junior - A Santa Casa segue com mais de 60% de ocupação de leitos Covid. E estamos observando um novo pico da doença. Provavelmente associado ao relaxamento do distanciamento social, devido aos feriados prolongados.

SCA - Devido a estes aumentos de casos, há estudos internos dos profissionais que trabalham na “linha de frente” em ampliar leitos?

Muniz Junior - Nós contamos hoje com 14 leitos de UTI e 14 leitos de enfermaria na Ala Covid. Além de 24 leitos que montamos recentemente numa nova ala que, numa eventual necessidade, podem ser usados. Importante reforçar que, apesar do Info Tracker apontar que o número de óbitos cresceu nos últimos dias, do início da pandemia para cá, a Santa Casa vem mantido uma taxa de letalidade baixa, de 18%. Isso quer dizer que, em cada 10 pacientes atendidos no hospital com diagnóstico de Covid-19, menos de 2 morrem. Isso se deve à nossa equipe altamente capacitada, formada por médicos, enfermeiros, fisioterapeutas e nutricionistas, que trabalham incansavelmente para garantir o melhor atendimento aos nossos pacientes. O que não significa que podemos relaxar nos cuidados. A população também precisa fazer parte desse esforço coletivo. Diferentemente de outros lugares do país, aqui em São Carlos não faltaram leitos para atendimento. Mas a população precisa respeitar as medidas de segurança e de isolamento social para que consigamos manter esses leitos disponíveis.

SCA - Com o passar dos meses, os cuidados para que estes profissionais foram aumentados no sentido de que não sejam infectados pelo novo coronavírus?

Muniz Junior - Desde a montagem da Ala Covid, tudo foi pensado para a segurança dos profissionais de saúde e dos pacientes. Os leitos de UTI Covid, por exemplo, têm antessalas para que o paciente fique isolado dos demais, assim evitando a contaminação. Os profissionais de saúde trabalham com todos os EPIs necessários (máscaras cirúrgicas, luvas, aventais e face Shields). Também contamos com as tendas desenvolvidas por empresários, voluntários e o Lions Clima. Prova disso é que apenas 5% dos profissionais da Santa Casa, desde o início da pandemia, foram contaminados pela doença. E até o momento, o hospital não registrou nenhuma morte entre os colaboradores e não temos nenhum funcionário afastado no momento por conta da Covid-19. Nossos protocolos de segurança e Medicina do Trabalho são seguidos rigidamente, além do monitoramento constante até o retorno ao trabalho.

SCA - Outra informação que causa apreensão no sistema Info Tracker é que a taxa de retransmissão do vírus em São Carlos é de 1,77. Significa que o índice é de que em cada 100 pessoas, 177 são infectadas. Que periculosidade isso representa em termos gerais?

Muniz Junior - A informação da retransmissibilidade não faz sentido matematicamente.

SCA - Diante de tal quadro, quais seriam as atitudes mais sensatas que a população deveria tomar?

Muniz Junior - As atitudes mais sensatas continuam sendo as mesmas.  Distanciamento social. Evitar aglomerações. Manter o uso de máscara mesmo intra domicílio

SCA - Qual o quadro que se desenha em São Carlos nas próximas semanas caso a sociedade não se atente para os números acima?

Muniz Junior - É preciso que as pessoas entendam que a pandemia não acabou. Que ainda não é hora de relaxar. Se a população não retomar os cuidados necessários, o que podemos ter, depois das festas de fim de ano, são UTIs lotadas e a perda de muitas vidas.

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