sábado, 20 de abril de 2024
Artigo Antonio Fais

O Retorno

16 Nov 2019 - 06h27Por (*) Antonio Fais
O Retorno - Crédito: Divulgação Crédito: Divulgação

Jack era seu nome. Simplesmente Jack.

O nome lhe garantiu, desde a mais tenra infância, pela unicidade, um certo charme e prestígio perante todos, principalmente as mulheres que tinham uma certa atração por ele, o nome, e depois por ele, a pessoa.

Já na pré-escola era Jack pra lá, Jack pra cá. As professoras enchiam a boca para falar Jack (djék – para que não paire dúvidas quanto à pronúncia). Ele era o preferido das professoras para as festas juninas e tudo mais. As meninas, apenas por sentir que ele era especial, embarcavam e assim ele foi se tornando uma cara popular e sedutor. Certamente isso não aconteceria se se chamasse João ou José ou ainda Benedito. Enfim, era Jack.

Meio magrelo, seu corpo foi tomando forma devido à natação.  Aos quatorze anos era popular entre as meninas e, por consequência, entre os meninos que adoravam os respingos de seu séquito.

Mildred, bonita, pouco mais nova que ele, que também fazia parte da equipe de natação, meio tímida, como todas, adorava Jack. Tinha, porém, a consciência que não era para seu bico. Mantinha-se próxima e foram ficando amigos. Esta amizade intensificou-se no cursinho, já que Jack havia reprovado no primeiro vestibular. Estudavam juntos e ela achava o máximo poder estudar com ele. As amigas morriam de inveja, afinal, era Jack e Mildred, Mildred e Jack, pra lá e pra cá. Isso, no entanto, não lhe garantiu mais que a amizade de Jack. Ele continuava o rei das meninas e a ela contava suas aventuras amorosas, como se fosse um outro amigo qualquer.

Separam-se de vez no começo do ano: ela passou no vestibular e ele não. Como seus pais mudaram de cidade, ela, agora aluna universitária, não mais viu Jack.

Na faculdade Mildred se surpreendeu! Descobriu-se bonita. Seus olhos verdes eram notados por todos, o seu corpo de anos de natação se destacava, em especial sua bunda – não havia quem não olhasse a bunda de Mildred. Foi eleita, logo no primeiro ano a Miss B da escola. Nos anos seguintes o concurso mudou de nome: era o troféu Mildred, do qual ela se tornou hors concours. Era, de longe, a garota mais popular e assediada da escola, mas guardava e aguardava ainda em seu coração Jack.

Finalmente Jack entrou na faculdade. Bixo de Mildred, ele a descobriu e encantou-se. Formavam o casal da escola: Jack e Mildred, Mildred e Jack.  Ele e seu nome e sua autoconfiança adquirida desde pequeno, ela e seu charme e inteligência e sua bunda hors concours. Assim foi o ano da faculdade. Com Mildred, Jack era um bom aluno; com Jack, que era muito mais experiente em termos de mulheres e relacionamento, ela conheceu o sexo, a paixão e amor. Eram o máximo!

Jack ainda era muito assediado e não resistia. Era um caso aqui, outro rolinho ali. Não tinha como durar e não durou. Separaram-se. Mildred, apesar de também muito assediada, todo o tempo curtia a sua paixão da infância.

Com as férias e o término do namoro, ela se recolheu. Para não ver Jack, foi ao litoral do Paraná, Caiobá, onde passaria as férias com uma amiga - a Val, uma linda amiga morena, também de olhos verdes, segunda colocada no Miss B, por quem  Jack tinha uma queda especial. Ficavam sós a semana toda, ela e sua amiga, exceto nos finais de semana quando desciam amigos e familiares.

No mesmo prédio, tinha um apartamento do tio da Val, um empresário, por volta dos quarenta, bonito e bem-sucedido. Ele, como toda a praia, se encantou por Mildred e, obviamente, a parte que nela mais chamava a atenção. Só e carente, flores e doces, jantares... E ela não teve como resistir aos encantos de um homem mais velho. E assim foram suas férias: sexo lento e repetido a exaustão, beijos demorados, café na cama, tardes na praia, cochilos vespertinos e noites mal dormidas. Ela sabia pertencer ao verão e no verão ficaria.

De volta à vida normal encontra Jack, também saciado de suas aventuras amorosas, com saudades. Ainda a grande paixão, declarada por ambos. Resolvem ficar juntos.

Ela, sem pressa, contendo seu ímpeto abre um vinho e o beija de forma lenta, o que o excita muito; devagar, vai lhe tirando a roupa e aos poucos faz amor com ele, de uma forma que ele nunca havia experimentado com mulher alguma. E de novo e, mais tarde um pouco, de novo. Ele, a princípio, sentiu-se, como todos os homens, o máximo, até cair-lhe a ficha “Onde ela havia aprendido tudo isso?”

Apesar das tentativas delicadas de Mildred, naquela noite não se amaram mais. Ele (não) dormiu pensando nela, pensando nela e nos outros: “O que ela teria feito durante as férias? Quantos seriam?”.

Na manhã seguinte, acorda com os beijos de Mildred. Os carinhos o excitam, mas, na hora H, vêm os outros homens de Mildred e ele não consegue. Só pensa nela, excita-se novamente, mas, mesmo só, os outros aparecem.

Tenta com outras garotas e nada! Tenta com Mildred e nada! De novo, outras, nada! Mildred, nada! E sua fama correu escola. Dormia pouco, falava pouco, estudava pouco e nada mais. Atrasou-se na escola. Dizem que engordou. Nunca mais apareceu nos encontros da escola. Quando a universidade fez 35 Anos, falamos dele: as más línguas dizem ter tomado aquele caminho que ninguém volta, sem retorno.

(*) O autor é escritor/filósofo, especialista em Aprendizagem, Linguagem e Escrita Criativa

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