quinta, 25 de abril de 2024
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O descaso com a Saúde Mental

16 Dez 2019 - 07h00Por (*) Bianca Gianlorenço
O descaso com a Saúde Mental -

Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), 3% da população sofre com transtornos mentais severos e persistentes, como a esquizofrenia. No Brasil, cerca de 1% tem a doença que, na maioria dos casos, só é diagnosticada quando o paciente já apresenta sintomas severos e contínuos, como delírios e alucinações.

Tal precariedade é reflexo de uma política pública que até os anos 1980 mantinha em funcionamento os famigerados manicômios, onde pacientes eram submetidos a tratamentos que, além de inadequados, eram desumanos. Esses depósitos de gente não só içavam um muro entre os pacientes e a sociedade, como criaram um estigma sobre o assunto que se estende até hoje. Se levarmos em consideração o número de unidades especializadas em saúde mental disponíveis no país, o panorama é alarmante.

Assim como a legislação prevê direitos para quem tem uma deficiência física, pessoas com transtornos mentais não podem ficar à margem de direitos básicos, como saúde e trabalho. Pacientes com esquizofrenia, sob tratamento adequado, passam por programas de reabilitação que os preparam para voltar ao mercado profissional. As empresas, no entanto, recusam a contratação, submetendo esses candidatos a mentir e negar parte de sua vida, como se a doença em si, o definisse.

Nota-se que desde os manicômios e hospícios, muito do preconceito sofrido pelo paciente, não mudou muito, e a saúde mental é vista com olhos bem distantes no Brasil. A Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta que o Brasil destina para o tratamento de doenças mentais uma das menores parcelas do orçamento da Saúde no mundo: apenas 2%. Os mais carentes acabam sofrendo mais essa realidade, aliás triste realidade, que é sentida no país todo. E a nossa cidade, infelizmente, se enquadra nesse perfil, nota-se o caos na saúde mental. Pessoas ficam meses esperando uma consulta com médicos, psicólogos, como se o problema pudesse esperar. Como lidar com essa questão? Onde está a preocupação com a Saúde Mental? Ficamos de mãos atadas, observando o aumento significativo de tais doenças e o descaso escancarado das nossas autoridades, “representantes do povo”. Lamentável!!!

Sabemos da importância de atuar logo no início do surgimento de uma alteração mental, isso diminui a severidade da doença, podendo retardar e até prevenir uma doença mental grave.

Doenças mentais graves tais como esquizofrenia e transtorno bipolar raríssimas vezes surgem repentinamente. Geralmente familiares, professores e amigos notam, ou a própria pessoa começa a reconhecer algumas mudanças em seu comportamento, experimenta um sentimento meio esquisito, percebe que sua forma de pensar não está legal. Atentem-se a qualquer mudança de comportamento que altere a rotina. Listo alguns sintomas, que ao persistirem necessitam de intervenção:

1) Isolamento social – a pessoa começa a se afastar dos amigos e perde interesse na vida social.

2) Queda no rendimento e funcionamento como pessoa – problemas na escola (queda do rendimento escolar), no trabalho (queda da produtividade, da capacidade de atenção e interação com os colegas, etc), dificuldades em outras atividades sociais, como interromper a prática de esportes, surgimento de dificuldade na execução de tarefas que antes eram feitas normalmente.

3) Problemas com o pensamento – dificuldade na concentração, déficit de memória, problemas com o pensamento lógico, alteração da fala, pensamento acelerado.

4) Aumento da sensibilidade – a pessoa começa a ficar muito sensível para luzes, sons, cheiros ou toques, e evita situações muito estimulantes.

5) Apatia – surge uma queda da iniciativa, diminuição do desejo de participar de qualquer atividade, desinteresse que não havia antes.

6) Sentimentos desconectados – sensação de estar desconectado consigo mesmo, sensação de estranheza do ambiente, sensação de irrealidade, bloqueio da capacidade de sentir o sentimento.

7) Pensamento ilógico – crença de possuir poderes pessoais especiais como saber o que uma pessoa pensa, ou crer que pode influenciar eventos, ideias delirantes (de ciúme, de perseguição, de grandeza, etc).

Não podemos dizer que se a pessoa apresenta apenas um ou dois sintomas destes é sinal de que ela tem uma doença mental. Mas se ela experimenta vários deles e causa sérios problemas na habilidade de estudar, trabalhar e se relacionar com os outros, ela deveria ser vista por um profissional de saúde mental. E as pessoas que apresentam ideias suicidas ou tentativas de suicídio, bem como as que estão tendo pensamento de violência contra outros, necessitam atenção imediata.

Mesmo com todos esses problemas que enfrentamos, insisto para não banalizarem a saúde mental, não olhe para ela com os olhos do governo!

(*) A autora é graduada em Psicologia pela Universidade Paulista. CRP:06/113629, especialista em Psicologia Clínica Psicanalítica pela Universidade Salesianos de São Paulo e Psicanalista. Atua como psicóloga clínica.

Esta coluna é uma peça de opinião e não necessariamente reflete a opinião do São Carlos Agora sobre o assunto.

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