quinta, 28 de março de 2024
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MEMÓRIA SÃO-CARLENSE: Antonio Cabeça Filho, líder que marcou época no sindicalismo são-carlense

09 Fev 2018 - 03h05Por (*) Cirilo Braga
Foto: Arquivo histórico - Foto: Arquivo histórico -

Quando se fala em sindicalismo em São Carlos, um nome de proa é o de Antonio Cabeça Filho, o líder dos trabalhadores metalúrgicos que marcou época ao comandar movimentos reivindicatórios durante décadas de grandes transformações sociais, políticas e econômicas no país. Sabendo-se que em seu tempo a cidade consolidou um forte e expressivo parque industrial é possível fazer ideia do tamanho da tarefa e das dificuldades de quem se propunha a organizar os operários das indústrias.

Em 1961 Cabeça Filho fundou a associação dos metalúrgicos, reconhecida pelo Ministério do Trabalho no dia 16 de junho, dando origem ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Carlos e Ibaté, cujas reuniões preparatórias ocorriam no porão da Catedral.  A carta sindical foi expedida em 25 de abril de 1962 pelo Ministério do Trabalho à Federação dos Metalúrgicos, que a repassou ao Sindicato em solenidade realizada no antigo Teatro São José, em São Carlos, em 17 de julho daquele ano. A célebre revista "O Cruzeiro" realizou uma ampla cobertura do evento.

Com sua experiência, Cabeça Filho atuou também na fundação dos sindicatos metalúrgicos de Ourinhos, Matão, Araraquara, Catanduva, além do Sindicato dos Trabalhadores em Bordados de Ibitinga e da Alimentação de São Carlos, entre outros. Em tempos duros e de muita luta, foi Secretário Geral da Federação dos Metalúrgicos do Estado de São Paulo.

Ousava visitar a Rússia ainda antes da Perestroika e tinha grande prestígio entre lideranças de Lipetsk; tanto assim que em 1990 chegou a levar uma comitiva de políticos e líderes comunitários de São Carlos para a Rússia, visita que foi retribuída no ano seguinte por líderes metalúrgicos da cidade russa.

UMA PASSEATA HISTÓRICA

Em 2018 completam-se 50 anos de um evento dramático na trajetória do líder sindical. Em 1968, ele assumiu a liderança de uma passeata dos trabalhadores do Frigorífico São Carlos do Pinhal, que estavam há 5 meses sem salário. Os operários buscavam comover a sociedade e pedir ajuda para comida. Porém, a polícia reprimiu a passeata e Cabeça Filho acabou preso e removido ao DOPS de São Paulo - onde foi torturado - e depois ao DOI-CODI do IIº Exército.  O sofrimento a que foi submetido está documentado no livro "Matizes de Uma Luta", do advogado José Roberto de Andrade Paino, e no curta-metragem "São Carlos 68", produzido pelo cineasta João Massarolo.

O documentário traz o depoimento de Cabeça Filho sobre aquele episódio: "Às 13 horas, vieram dois policiais e me levaram para a delegacia. O delegado tentou me convencer a não sair com a passeata. Para o governo era uma vergonha, porque ninguém estava fazendo isso no Brasil inteiro. Nós éramos os primeiros".

"Não tem jeito, eu vou ficar com os companheiros. Vou sair em passeata com os companheiros e haja o que houver, nós estamos juntos", disse o sindicalista. "Ele (o delegado) olhou para mim e disse: 'Então está confirmada a sua prisão'". Outras lideranças deram continuidade à passeata, que foi contida a poucas quadras da sede do Sindicato dos Metalúrgicos.

"Quem é que estava na passeata? Ladrão, assassino? Era gente pobre, miseráveis, de mãos calejadas, trabalhadores", afirmou Cabeça Filho. Ele relembrou ainda que os estudantes do campus da USP na cidade se solidarizaram com os trabalhadores e participaram da passeata.

Somente em abril de 2010, a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, declarou sua condição de anistiado político.

TEMPOS DE LUTA

Nos anos da ditadura militar, o sindicalista participou ativamente da organização da luta contra o arrocho salarial, pelo fim da ditadura militar, pela anistia, pela Constituinte e pelas diretas já.

Em 1986 negociou em São Carlos o primeiro acordo coletivo de redução de jornada de trabalho de 48 para 44 horas semanais, que depois foi seguido pelos sindicatos dos metalúrgicos de Jundiaí, Guarulhos, Santos, transformando-se na Constituinte em um direito de todos os trabalhadores brasileiros.

Defensor ferrenho da unicidade sindical e da contribuição sindical compulsória, em 2007, foi eleito presidente de honra da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB).

Mesmo com a saúde debilitada, Cabeça Filho permaneceu na diretoria do Sindicato até setembro de 2010.

Ao falecer vitimado por um infarto, deixava um legado que ia muito além das conquistas para a instituição - como o clube de campo dos metalúrgicos e uma escola, por exemplo. Lançava para a posteridade a força do exemplo e a garra com que lutou por democracia, liberdade e garantia dos direitos dos trabalhadores. Essa foi a marca do sindicalista reverenciado pela cidade de São Carlos onde também foi vereador na Câmara Municipal nas legislaturas de 1969/1972, 1973/1976 e 1989/1992, presidente do Legislativo (1991) e candidato a prefeito por duas vezes - em 1976 e em 1982 pelo MDB.

Em sua homenagem, a Casa do Trabalhador, vinculada à Secretaria Municipal de Trabalho, Emprego e Renda, foi oficialmente denominada "Casa do Trabalhador, Antônio Cabeça Filho", conforme determina a Lei número 16.162, sancionada em 23 de maio de 2012, de autoria do vereador Marquinho Amaral, então presidente da Câmara Municipal.

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