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Cuidando da Saúde Mental em Tempos de Pandemia

25 Jul 2020 - 08h23Por Anaisa Mazari
Cuidando da Saúde Mental em Tempos de Pandemia -
Nesta semana completamos quatro meses de pandemia da Covid-19 no Brasil. Mudanças, perdas, reconstruções, isolamentos e distanciamentos, mais mudanças... Fase de grande instabilidade que suscita cada vez mais cuidados para com a saúde mental. A experiência emocional de estar em meio à pandemia, em seus efeitos, é muito parecida com o que se observa em pessoas que vivenciaram grandes catástrofes, guerras e desastres naturais. Na era da Covid-19 em que quase tudo se volta para a prevenção ao contágio da doença, a saúde mental precisa ser observada, sendo um importante aspecto da saúde geral – secundarizado muitas vezes, mas diretamente interferente e determinante na saúde física, imunidade, surgimento de doenças correlatas etc.   
Ainda que o prolongamento da pandemia traga sensações diversas em diferentes ciclos do processo, é ponto comum que as pessoas se sintam em estado de alerta de forma intermitente ou permanente, ativando com uma constância muito maior, mecanismos de luta e fuga que são neurofisiológicos e protetivos em situações de perigo, úteis para a adaptação e ação adequadas mediante os riscos que fazem parte da vida, garantindo a sobrevivência em muitas situações. A questão é que se torna uma árdua tarefa para o nosso mundo emocional estar em adaptação a tantas mudanças ao mesmo tempo e em um ritmo tão frenético ditado pelas incertezas e instabilidades. Além disso, os mecanismos de luta e fuga consomem uma grande energia quando são ativados em tão elevada constância. Insatisfações, frustrações, irritabilidade, tédio, insônia, angústias, desmotivação, desânimo, instabilidade emocional e doenças físicas correlatas são reações agudas a essa alta carga de estresse, merecendo atenção e cuidados – sendo a primeira atenção necessária, aquela que se debruça aos sentimentos e sensações que comunicam necessidades emocionais que precisam ser atendidas neste especial momento de tantas dificuldades. Se esses sintomas estiverem persistentes e intensos, afetando significativamente a qualidade de vida e prejudicando a rotina funcional, pode ser inclusive o momento de buscar ajuda profissional.
 
A radical mudança de estilo de vida com todos os novos hábitos que são necessários para a prevenção, assim como a supressão de hábitos culturalmente valorizados e cotidianos, até mesmo com significado afetivo de proximidade e acolhimento como o toque, o contato físico, beijos e abraços, trouxeram e ainda trazem grande sensação de solidão e vazio em um momento em que presença e trocas afetivas (que agora demandam também uma nova construção de significado e de expressão) seriam contributivas para o enfrentamento da pandemia. Rotinas alteradas também deixam vazios – já que tais rotinas muitas vezes já eram “substitutos” de vazios existenciais, os quais no momento inevitavelmente emergem, deixando de estarem mascarados. Atividades de lazer e de higiene mental restritas em meio a tantas demandas obrigacionais que só aumentam e disparam os gatilhos do estresse também fazem uma falta enorme para descarregar a tensão. Além do confronto com as dinâmicas familiares já com comprometimentos relacionais significativos há tempos, empurradas “para baixo do tapete” que neste momento já não podem ser ignoradas. Efeitos colaterais inevitáveis frente a uma doença para a qual não se tem tratamento eficaz e comprovado e nem vacina, sendo o único controle possível a mudança de hábitos. Muitas demandas que só podem ser equacionadas transitoriamente, tendo em vista as instabilidades, a partir de uma profunda percepção de seus efeitos e de formas de conseguir se cuidar, discriminando inclusive o limiar entre o que é compreensível para a fase e o que já demonstra o acometimento por um quadro psiquiátrico já instalado, o que norteará os cuidados necessários a serem praticados. Alguns pontos a serem refletidos e praticados podem ser:
 
- Ter empatia por si mesmo: quando o amor próprio está fortalecido, fica mais fácil observar o próprio mundo interno e perceber necessidades. Compreender-se, saber que teremos dias em que o humor, a produtividade e a motivação estarão afetados fazem parte dessa empatia autodirigida, levando à busca de autocuidado que certamente trará dias melhores. 
- Conectar-se: nossos ancestrais passaram por pandemias como a Gripe Espanhola sem recursos tecnológicos. Temos ao nosso favor na atualidade uma diversidade muito grande de ferramentas de comunicação à disposição. Não hesite em usá-las. Pode parecer estranho no começo, mas posteriormente, pela repetição, passa a fazer parte do cotidiano. Precisaremos estar flexíveis para atravessar o momento sem perder as novas possibilidades e oportunidades. Criar e fortalecer redes de apoio é imprescindível e ajuda a diminuir a sensação de solidão.
- Recriar rotinas: muitas coisas mudaram, mas algumas coisas podem estar ainda na nossa governabilidade. Discriminar e exercer a organização da própria rotina dentro das possibilidades pode auxiliar e muito no enfrentamento do momento, ajudando a suprimir parcialmente a sensação de impotência no contexto da crise.
- Abandonar o perfeccionismo: em tempos de necessárias reinvenções, muitas tentativas serão realizadas até o encontro dos pontos de equilíbrio necessários. Sobretudo profissionalmente, muitas pessoas vêm se sentindo confrontadas e obrigadas a acertarem de primeira nas readequações. Estamos todos aprendendo e com o tempo, haverá maior clareza das tentativas e do que funciona melhor ou não. No momento, o importante é estar em movimento e lidar bem com o que é “falho” por simplesmente estar em construção. E tudo bem, faz parte da vida e mesmo o que parece “falho” será importante para se alcançar os resultados necessários no tempo pertinente.
-  Promover autocuidado: yoga, exercícios físicos, corrida, tomar sol, caminhada, artes, artesanato, assistir séries, relaxamentos, exercícios de respiração, aqui vale qualquer coisa prazerosa e saudável que ajude a tirar o foco das notícias e problemas diversos. Que na realidade é algo a ser praticado durante a vida, não apenas durante a pandemia.
- Manter-se no presente: viver um dia de cada vez lidando com as demandas que chegam durante a rotina diária (já repleta de estímulos), evitando antecipar ou buscar controlar fatores e aspectos maiores sobre os quais não exercemos poder.
- Gestos de solidariedade: ajudar pessoas ativa áreas cerebrais responsáveis pela sensação de prazer, de gratificação e de recompensa, além de nos transportar para o conhecimento de realidades que podem nos atentar para as pequenas-grandes coisas da vida potencializando a valorização do que é positivo e já faz parte de nosso cotidiano.
 

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