terça, 23 de abril de 2024
Artigo Rui Sintra

As diferenças entre nós e os “outros”

02 Mai 2020 - 06h00Por (*) Rui Sintra
As diferenças entre nós e os “outros” -

Em tempos de COVID-19 e de todas as alterações verificadas no cotidiano da população mundial, nomeadamente em termos de saúde pública, economia e convívio social, observa-se que cada nação reagiu de forma diferente em face à pandemia. Ao estabelecerem regras para prevenir e combater a COVID-19, os governos indicaram - uns melhores que outros - o que seus cidadãos deveriam fazer neste período difícil. Houve países que levaram o caso muito a sério, correspondidos imediatamente por sua sociedade, enquanto outros não levaram tão seriamente as recomendações dos órgãos de saúde internacionais - OMS, por exemplo -, sugerindo metodologias que claramente colocam em risco a vida de seus cidadãos: do isolamento social rígido, ao relaxamento incompreensível, com direito, inclusive, à frequência de praias, piscinas e bailes.

Tenho sempre como norte - e outra coisa não seria de esperar - observar o que se passa em meu país natal (Portugal) em todas as suas vertentes, seja na política, na economia, no esporte, no social, na segurança, na saúde, na educação, pois entendo que essas áreas são aquelas que, bem geridas, fazem a a qualidade de vida de um povo. Reparem que estou falando de Portugal, um país que no espaço de aproximadamente de três décadas começou a abandonar seu status de atraso, ignorância e desorganização, disseminando dessa forma um novo conceito de país para as gerações que se seguiram. Amo o Brasil, mesmo com todas as suas dificuldades e particularidades, mas é óbvio que amo de paixão o meu país, pois ele me dá exemplos de como ser, como cidadão, mesmo longe de seu solo.

Em editorial publicado no dia 27/04, no jornal “O Público”, o jornalista e meu colega, Manuel Carvalho, foca sua escrita nos perigos que rodeiam o previsto regresso à “normalidade” no dia 27/04, depois de o país ter levado muito a sério a ameaça do vírus e de ter vencido uma batalha, mas não a guerra. Manuel Carvalho salienta que se hoje Portugal é um caso de sucesso na contenção dos danos do novo coronavírus, se foi possível “aplanar” a curva das infecções, limitar a mortalidade e gerir com folga os recursos do Serviço Nacional de Saúde (SUS),torna-se essencial que todos os portugueses se convençam de que todos estes resultados são voláteis. “É crucial que a atitude e a maturidade que a sociedade portuguesa revelou nestes quase quarenta dias de estado de emergência se mantenham”.

Com o meu respeito, transcrevo abaixo uma das partes mais importantes do citado editorial de Manuel Carvalho.

Não é o Governo que tem a chave para o sucesso da fase de abertura que hoje se anuncia: são as pessoas. Acreditar que os resultados obtidos até agora são uma garantia de que o pior já passou é um primeiro passo para o desastre. Pensar que, depois de controlada a curva, já se pode regressar à vida descontraída de outrora, vai alimentar os fluxos de propagação do vírus e impor o regresso de medidas mais drásticas de confinamento. Julgar que o levantamento de restrições mais severas - abrir as lojas de bairro ou aprovar o regresso de uma parte de nossos alunos às escolas - legitimam o retomar da nossa vida social normal é condição para que o contágio acelere e o medo de Março se reinstale. O que acontecer a seguir não vai depender das medidas do Governo ou do empenho das autoridades sanitárias: está nas nossas mãos e na nossa responsabilidade. O desafio que se anuncia com o regresso da normalidade possível é enorme. O Governo faz o seu papel, abdica da emergência mas preserva o estado de calamidade, determina regras, faz avisos, salientando que poderemos ter de dar passos atrás. Mas, é possível que o afrouxamento das medidas leve as pessoas cansadas do confinamento, emocionalmente afetadas pela distância dos amigos ou familiares e angustiadas com a negra realidade em que vivem, interpretem essa distensão como um sinal de que aperto acabou. O maior movimento nas ruas das cidades ou os passeios à beira-mar são disso um sinal claro. Vencer essa percepção que resulta mais do desejo do que da realidade vai ser difícil. Mas é crucial. Se o país levou muito a sério a ameaça do vírus e o conteve, terá de ser capaz, agora, de se manter alerta para gerir o seu potencial de destruição. Vencemos a primeira batalha, mas a guerra é longa e dura. O pior que cada um de nós pode fazer é baixar a guarda.

Cidadãos de São Carlos: pensem nisto.

(*) O autor é Jornalista profissional / Membro da GNS Press Association (Alemanha) / Correspondente internacional freelancer. MTB 66181/SP.

Esta coluna é uma peça de opinião e não necessariamente reflete a opinião do São Carlos Agora sobre o assunto.

Leia Também

Últimas Notícias