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Sexta-feira 13: conheça as principais lendas urbanas de São Carlos

13 Dez 2019 - 06h33Por Por Cirilo Braga
Sexta-feira 13: conheça as principais lendas urbanas de São Carlos - Crédito: Arquivo Pessoal Crédito: Arquivo Pessoal

Algumas célebres lendas acompanharam a história de São Carlos. Muitas delas ainda permanecem vivas na memória de antigos moradores, personagens de um passado em que a paz da vida real no pacato cenário da cidade, contrastava com os temores imaginários que povoavam um cotidiano repleto de fantasmas e assombrações.

Boêmios que frequentavam os botecos da Avenida São Carlos no início dos anos 1960 seriam capazes de jurar que viam um fantasma passar no último bonde a caminho do cemitério. Por volta da meia noite, moradores da região garantiam ver passar correndo o chamado "fantasma do Trevo".

FANTASMA DO TREVO - Somente alguns anos mais tarde descobririam que a "assombração" era o andarilho Paulino se divertindo com um esvoaçante lençol. Negro, franzino, enfiado em roupas fartas, debaixo de um chapéu e não raro coberto por uma capa, Paulino circulava pelas ruas, seguido por dezenas de cães a quem dava alimento. Dizem que ele costumava deitar na calçada e quando alguém passava, fazia ouvir um vozeirão, sem mexer os lábios.

Ainda na época, se divertia em relatar a quem quisesse ouvir, detalhes de suas "viagens em discos voadores" quando OVNIs despertavam grande curiosidade. O "fantasma" que ele criou também assustava quem passava pela rodovia Washington Luis, que tinha pista única e o trevo de acesso a São Carlos era estreito. Os caminhões que seguiam na direção de Araraquara costumavam descer na "banguela" até o fundo do vale nas proximidades do trevo. Os faróis dos veículos de então eram pouco mais do que lamparinas. Paulino cobria-se com um lençol e atravessava a pista correndo, à frente dos caminhões, apavorando os motoristas.  Alguns deles paravam num posto de gasolina logo adiante, defronte à famosa "Casa da Lucy", de onde os comentários se espraiaram, ampliando a fama e o mistério das peripécias de Paulino.

MORTOS-VIVOS NO BONDE - Nos anos 1940 difundiu-se um fato que teria ocorrido na Linha 1 do bonde, que ligava a Estação Ferroviária a Cemitério Nossa Senhora do Carmo. Certa noite, ao realizar sua última viagem na linha, a das 23h, motorneiro e cobrador surpreenderam-se ao ver dezenas de pessoas bem vestidas embarcando no ponto diante do Cemitério. Homens e mulheres rapidamente se acomodaram nos bancos de madeira e permaneceram em silêncio quando o veículo partiu rumo ao centro da cidade. Na primeira descida, porém, misteriosamente aqueles passageiros todos se transformaram em fumaça e desapareceram, para desespero dos funcionários da CPE - Companhia Paulista de Eletricidade - a concessionária do serviço de bondes, que daí por diante ficaram com muito medo de trabalhar à noite na Linha 1.

A MOÇA QUE DANÇOU COM O DIABO - Já o caso da moça que dançou com o diabo tem registro no livro "Recordar é Viver", do cronista Nicola Gonçalves, foi tema de uma música composta por Teddy Vieira, gravada pela dupla Vieira e Vieirinha em 1953, e virou curta metragem dirigido por João Paulo Miranda Maria, que ganhou uma menção especial no Festival de Cannes, em 2016. Uma moça que fazia aniversário resolveu ir a um baile em plena noite de sexta-feira santa e lá se encantou com um rapaz com quem dançou até a meia noite. Foi quando então percebeu que o moço tinha pés de pato, seus olhos pareciam bolas de fogo, ouviu-se um forte estrondo e um cheiro de enxofre invadiu o recinto. No mesmo instante, a figura do diabo apareceu no lugar do rapaz e desapareceu numa nuvem de fumaça. Para completar a história, diz-se que a moça morreu dias depois e seu corpo foi sepultado no Cemitério Nossa Senhora do Carmo.

Para que o relato atravessasse as décadas seguintes, muitos garantiam que o baile de fato aconteceu no ano de 1943 numa casa da rua Major José Inácio, esquina com a rua Rui Barbosa. Melhor dizendo, num casarão que passou a ser apontado como "a casa da moça que dançou com o diabo", até ser demolido, não sem o estigma de alguma maldição: um andarilho que ali se abrigava foi assassinado e nada do que no casarão se instalasse, prosperava. Mortes nas proximidades, como a de um piloto de avião e sua namorada, também ajudavam a propagar o mito. Assim como a pequena capela que por muito tempo existiu no cemitério, em cujo interior se dizia haver além do nome e foto da moça uma mala com o vestido que usara no célebre baile e a imagem de um anjo empunhando uma lança com a qual espetava a cabeça de um dragão.

ASSOMBRAÇÃO DA FIGUEIRA - Outra lenda famosa, que atravessou décadas, foi a da "Assombração da figueira", citada por Pedro Fernandes Alonso num de seus artigos no jornal "A Tribuna" nos anos 1970. O que se falava é que toda sexta feira o fantasma de um ex-escravo era enforcado numa grande figueira que existia na Praça da Catedral. Tudo por conta do linchamento que ali aconteceu, de um rapaz negro, acusado de estuprar uma moradora da rua Conde do Pinhal.Um conhecido empreiteiro da época, ao passar certa noite pelo local acompanhado de um empregado, viu um corpo balançando no alto da figueira como um pêndulo. Ficou em pânico e desatou a correr. No dia seguinte a "visão" se esclareceu: o fantasma era na verdade o boneco de Judas que a molecada havia dependurado e explodido com uma série de bombas na véspera.

PROCISSÃO NO CAMPO DO RUI - Uma das mais antigas lendas de São Carlos envolve o local onde se encontra hoje o campus I da Fesc, na Vila Nery, que sediou um cemitério entre 1882 e 1890, ficando fechado até por volta de 1930. Em 1932 aquela área deu lugar ao Estádio Rui Barbosa, cuja construção foi envolta em histórias que se espalhavam pela cidade. Conta-se que no início da construção do estádio, foram descobertas ossadas que haviam sido esquecidas no local quando foram incinerados os ossos dos que ali estavam sepultados. Nas noites de sextas-feiras havia uma procissão de pessoas encapuzadas que saíam exatamente à meia noite, davam a volta no campo e desapareciam sem deixar vestígios. Dizia-se que eram pessoas que haviam sido enterradas no antigo cemitério e cujos ossos não foram incinerados. O relato consta no livro "Aspectos do Folclore São-carlense", de Lígia Templo Garcia Gatti.

BIQUINHA DO PADRE - Por anos a fio acreditou-se nos poderes da água da "Biquinha do Padre". Gerações cresceram ouvindo a frase "quem bebe a água da Biquinha não pode mais viver fora de São Carlos". Tudo porque no finalzinho do século XIX o primeiro pároco de São Carlos, o português Joaquim Botelho da Fonseca descobriu uma fonte ali na rua José Bonifácio entre as ruas Sete de Setembro e Marechal Deodoro,onde hoje se encontra o Teatro Municipal. O padre canalizou a água por meio de uma bica que imaginava usar sozinho. Por algum tempo conseguiu fazer segredo da descoberta, que mais tarde caiu no conhecimento público. Acabou virando "point" da sociedade que atribuiu poderes medicinais à água que depois passou a ser distribuída pela Prefeitura nos chafarizes da cidade. Quanto ao casarão onde o padre morava, durante anos antes da construção do Teatro, tornou-se um lugar tido como mal assombrado, onde se dizia que o fantasma do padre aparecia todas as sextas-feiras.

PRÉDIO DO FÓRUM - Muitos ainda acreditam que o fantasma de um antigo funcionário do Fórum assombra o Edifício Euclides da Cunha, no centro da cidade. "Seu" Mattos era servente do Fórum que funcionava no prédio onde hoje está a Câmara de São Carlos. Sujeito fidalgo, extremamente atencioso, matou-se por envenenamento e certa manhã seu corpo foi encontrado na entrada da sala do café no primeiro andar do edifício. Poucos tiveram acesso ao conteúdo do bilhete que deixou e que decerto ajudou a criar a lenda. Na pacata São Carlos da época, a Câmara dividia o prédio com o Fórum e no subsolo funcionava a cadeia pública. Há quem diga que não só ele, mas outros personagens que vieram depois também "transitam" pelos casarões do centro.

Por Cirilo Braga

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