sexta, 19 de abril de 2024
“Vivi para dar este testemunho”

“A Covid-19 serviu para calar a minha boca. Ela mata”

João Pedro, motorista da Casa do Acolhimento Infantil ficou 23 dias internado na UTI do HU entre a vida e a morte

16 Set 2020 - 07h28Por Marcos Escrivani
João Pedro: “Eu achava que era uma doença política. Mas ela mata. E quero pedir a todas as pessoas que lerem esta reportagem, se cuidem” - Crédito: DivulgaçãoJoão Pedro: “Eu achava que era uma doença política. Mas ela mata. E quero pedir a todas as pessoas que lerem esta reportagem, se cuidem” - Crédito: Divulgação

Antes, uma pessoa que acreditava ser a Covid-19, uma doença criada para se fazer politicagem. Pensava que não era tão nociva e letal. Mas, após ser infectado pelo Sars-Cov-2, mudou de ideia. Foi internado e ficou 23 dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Universitário. Pensou que iria morrer e chegou a pedir para as filhas que uma “gaveta” fosse feita no cemitério Nossa Senhora do Carmo para ser enterrado junto aos seus irmãos.

O motorista João Pedro Adão, 60 anos, que trabalha na Casa de Acolhimento Infantil passou por este drama. Pai de Ana Paula e Suelen, é avô de Esther e de Gabriele, que irá chegar em novembro.

Na tarde desta terça-feira, 15, em sua casa, na rua Basílio Dibbo, Jardim Cruzeiro do Sul, ele recebeu o São Carlos Agora e ao lado de Ana Paula e da netinha Esther, contou emocionado os momentos de angústia que passou após ser diagnosticado com o novo coronavírus, causador da pandemia da Covid-19. Somente ele foi positivado para a doença. Os demais familiares, não.

Separado, João Pedro mora sozinho e no local onde trabalha, uma colega de profissão e quatro crianças, na época, foram positivadas para a infecção.

Pertencente ao grupo de risco, João Pedro começou a ter os primeiros sintomas no dia 28 de julho. Foi na UPA Vila Prado e com suspeitas, fez exame para a Covid-19. Automaticamente foi afastado do trabalho. Porém o resultado sairia dias depois.

Em casa, os sintomas pioraram. Dores de cabeça, perda do olfato e paladar, diarreia, náuseas, perda do apetite. No dia 30, retornou à UPA Vila Prado e com a piora no quadro de saúde, foi encaminhado ao Hospital Universitário. Neste meio tempo saiu a positivação.

No HU, João Pedro ficou internado na enfermaria e dois dias depois, foi para a UTI, por onde ficou 23 dias, dos quais, 21 entubado. Nestas três semanas, o Sars-Cov-2 atacou severamente e ele teve infecção generalizada e passou a tomar doses cavalares de antibióticos.

“Os médicos me diziam que meu pai ficou desacordado por 21 dias. Foi sedado e tomava relaxante muscular para poder respirar com a ajuda da máquina”, explicou Ana Paula. “A gente não sabe onde ele foi infectado. Por ser motorista anda pela cidade toda. O fato é que este coronavírus abalou a saúde dele”, comentou a filha.

“ELA (DOENÇA) CALOU MINHA BOCA”

Visivelmente emocionado e com a voz embargada, João Pedro respirava fundo para responder as perguntas. “Fiquei dois dias acordado. Estava em uma sala, sozinho. A sensação é horrível. A gente fica bobo e nem conseguimos nos lembrar direito como fomos parar lá. As últimas coisas que eu lembro é que cheguei na sala (UTI) e estava sendo monitorado pelos médicos. Mas antes de apagar, lembro que pedi para minha filha fazer uma ‘gaveta’ no cemitério junto aos meus irmãos porque achei que não ia voltar para casa. Me sentia muito mal. Mas muito mesmo. Pensei que não iria aguentar. Ai apaguei...”, disse, chorando. “Estava com muito medo de morrer”, completou.

Ao lado, Ana Paula ouvia atentamente o relato do pai. Seus olhos, mareados. “Para nós foram três semanas de angústia. Eu chorava muito e tinha que cuidar da minha irmã (Suelen, gestante de Gabriele, que chega em novembro). Tudo o que eu ia dizer, era com muito cuidado”, afirmou.

Porém, após 21 dias de apreensão e sem um norte, em uma tarde, o telefone toca. Era do Hospital Universitário. Diante do quadro que o pai apresentava, Ana Paula tinha medo de ouvir. Mas de repente, o que considerou um milagre. Do outro lado, a frase que não esquece mais da responsável em dar a notícia: “Ana Paula, seu pai voltou. Foi desentubado e está orientado. Está consciente. Apenas um pouco confuso”. Após este relato, a filha disse que “perdeu o chão”, mas de alegria. Afinal, seu “bom velhinho” estaria de volta em poucos dias. “Sinceramente fiquei boba. Uma alegria que não sei explicar. Saber que poderia abraça-lo novamente em casa”, comentou.

Após o comentário da filha, mais emocionado ainda e com os conselhos para que procurasse se controlar, João Pedro fez um desabafo. “Deus é maravilhoso e permitiu que eu vivesse para dar este testemunho. Esta doença serviu para calar a minha boca e hoje vejo a vida bem diferente. Quero apenas pregar a paz, o amor e ajudar o próximo”, enfatizou.

João Pedro garante que nasceu de novo e voltou a dizer. “Eu achava que era uma doença política. Mas ela mata. E quero pedir a todas as pessoas que lerem esta reportagem, se cuidem. Usem máscara e não abusem. Não desejo a ninguém o que eu passei. Esta doença deu um breque em minha vida”, disse.

Por fim, João Pedro agradeceu a equipe médica, de enfermeiros, faxineiros, atendentes do Hospital Universitário. “Foram profissionais maravilhosos que cuidaram de mim o tempo todo. Agradeço de coração a cada um que esteve ao meu lado durante todo o tempo”, enfatizou.

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