quinta, 28 de março de 2024
Memória São-carlense

A igreja de São Sebastião

16 Mar 2018 - 04h35Por (*) Cirilo Braga
A data chave para os destinos da Igreja de São Sebastião foi 13 de maio de 1932 - Crédito: Arquivo PessoalA data chave para os destinos da Igreja de São Sebastião foi 13 de maio de 1932 - Crédito: Arquivo Pessoal

Havia um largo onde é hoje a Escola Álvaro Guião, o “Largo de São Sebastião” e em 1876 surgiu a ideia de pedir o terreno à Câmara (então Prefeitura) para construir a igreja. Uma campanha de donativos foi desencadeada, possibilitando a construção de um modesto templo que ficou incompleto e, exposto ao tempo, veio abaixo num temporal. Não foi pouca coisa: os registros históricos falam em uma faísca elétrica e um tufão.

Com a venda do material que restou e com dinheiro arrecadado em nova campanha, finalmente se ergueu a capela de São Sebastião em 1892, como relatou o cronista Cincinato Braga. Mas a alegria durou pouco. A capela acabou demolida e o terreno do que veio a constituir a Praça Rio Branco não ficaria vago: foi adquirido pelo Município em permuta com o Bispado e oferecido ao governo do Estado para receber a Escola Normal Secundária.  Você leu certo: a praça virou igreja, que virou escola.

Os antigos livros de história nos convidam a um passeio interessante pelos caminhos que a cidade seguiu. Além do que, é possível dar asas à imaginação. Pense no cenário de 1910. Na parte alta da colina central, onde hoje fica a Avenida Doutor Carlos Botelho e chamam de “alto da cidade” havia um descampado. Os padres da Companhia de Jesus ao desembarcar não encontram aqui selva e índios como os jesuítas dos primórdios da história do Brasil, e sim casas simples e chácaras. Padre Bento José Rodrigues justificaria seu nome ao liderar a construção da igreja, inaugurada em 1924.

Consta que o trabalho dos jesuítas era voltado aos humildes “embora logo se voltassem para as classes mais cultas, abrindo até uma editora que alcançou renome nacional”. Estariam eles profetizando o futuro da “Capital da Tecnologia”?  Com o crescimento da cidade, ampliaram a igreja, construíram o corpo central e a residência anexa.

A data chave para os destinos da Igreja de São Sebastião foi 13 de maio de 1932. Um problema administrativo com a Companhia de Jesus fez com que o centro-sul do Brasil ficasse entregue à província italiana da ordem. Caberia o norte e nordeste à província portuguesa. Com isso, residência local, excluída da jurisdição provincial, foi extinta.

Os jesuítas deixariam em São Carlos os restos do padre Bento, aqui sepultado, e a cidade a partir de 1932 receberia os religiosos da Congregação de São Paulo da Cruz, que tinham sede apenas em São Paulo na igreja do Calvário.

Os passionistas puseram mãos à obra: construíram as duas naves laterais, as capelas de São Paulo da Cruz e Santo Antonio, alteraram o campanário modificando o formato da cúpula para o de pirâmide, colocaram mais tarde o carrilhão e o relógio inaugurados no Natal de 1947.

Tudo isso está nos livros de história que tampouco conseguem guardar toda a vida que impulsionou os acontecimentos. A vida de um templo – e da própria Igreja, como vem mostrar o Papa - é o povo que caminha com ela. É a gente que em instantes de oração e silêncio redescobre o mistério da fé. “Se eu quiser falar com Deus tenho que calar a voz”, dizia a canção do tempo em que a São Sebastião se tornou paróquia, em 1972. Se uma trilha sonora houver, que seja como a dos melhores tempos do coral Santa Cecília, regido pelo maestro e compositor padre Fulgêncio Piacentini, de saudosa memória.

Pois um fundo silêncio me acompanhava quando entrei na igreja dia desses e ali permaneci por instantes, escoltado pelas mesmas imagens, pela beleza dos afrescos e dos altares, sob a luz que atravessava os vitrais iluminando os detalhes da nave onde tudo perpetua a recordação de minha mãe ajoelhada, rezando por nós.

(*) O autor é cronista e assessor de comunicação em São Carlos  (MTb 32605) com atuação na Imprensa da cidade desde 1980. É autor do livro “Coluna do Adu – Sabe lá o que é isso?” (2016).

Esta coluna é uma peça de opinião e não necessariamente reflete a opinião do São Carlos Agora sobre o assunto.

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